Coelho Netto e o Espiritismo. Outra vez?

Capa da 1a. edição
Capa da 1a. edição

Alguns estudiosos da Transcomunicação Instrumental tratam o caso de Coelho Netto como o primeiro em que um espírito, o de sua neta, fala com um encarnado – a mãe da menina – pelo telefone. A afirmação foi dada pelo próprio escritor numa famosa entrevista concedida ao Jornal do Brasil no finalzinho do primeiro quarto do século XX. Clique aqui para ver e ler o documento integral.

A posse, o poder, o silêncio

A era pós-Thiesen é a era da consolidação da Estratégia Thiesen. E quem a consolida? Aqueles mesmos a quem ele um dia revelou as delícias do poder e atraiu para junto de si, polindo suas crenças e hábitos. A FEB é a Casa de Ismael, Ismael é o poder. A FEB é o Espiritismo, o Espiritismo é a FEB. O que mais quer um homem sonhador, que imagina o Espiritismo se entranhando na sociedade mundial e oferecendo as delícias do novo reino? Leia o texto integral clicando aqui.

Herculano estuda os cinco livros da codificação de Kardec

selo_encart_wwwTodo o texto resulta de um trabalho longo e paciente de decupação de fitas magnéticas onde a palestra foi gravada, mantendo a coloquialidade da conversa, fator esse que permite acompanhar o professor em sua “aula” e com sua forma peculiar de se relacionar com a plateia de modo próximo, espontâneo, em que busca trazer para perto de si aqueles que se encontram na condição de alunos. Clique para ler o texto integral.

Duas obras e um centenário

Dentro da programação do Centenário de J. Herculano Pires, conduzida pela Fundação Maria Virgínia e J. Herculano Pires, duas obras acabam de entrar em circulação: 365 momentos espirituais com J. Herculano Pires e Kardec é Razão. As duas obras são assinadas por Wilson Garcia.

365_momentos_esp_524c18708e0e8A primeira delas é uma agenda permanente contendo pensamentos de Herculano Pires, selecionados em grande parte de seus livros com abordagem de variados assuntos. Ou seja, uma agenda para todos os dias do ano. Em cada um desses dias você pode desfrutar de uma pérola literária e espiritual de um dos maiores pensadores espíritas brasileiros. Ter em mãos essa AGENDA PERMANENTE é uma forma de começar e terminar bem o dia. Cada frase, cada palavra, cada ideia possibilita refletir sobre si e sobre a vida, de modo a afirmar o primado do espírito, com todo o otimismo que o cotidiano solicita e agradece.

A segunda obra é uma reedição do livro lançado em 1998, agora totalmente revisto e Kardec____raz__o_52bc64c91b8f3atualizado pelo autor, em que é realizado um estudo livre do pensamento de Herculano Pires a partir de uma seleção criteriosa de textos e temas. Na contracapa do livro, pode-se ler esta interessante interrogação feita pelo conhecido escritor Mario Graciotti: “De que distâncias, de que regiões, de que épocas virá esse espírito, que se instalou na engrenagem somática de um dos mais curiosos fenômenos intelectuais do Brasil nascente, o poeta, o jornalista, o escritor, filósofo Herculano Pires?”

As obras encontram-se disponíveis no seguinte endereço:

http://editoraeme.com.br/livros/365herculanopires/pgxso-product-details/prx-427/ctx-2.html e

http://editoraeme.com.br/shop/pgxso-product-details/prx-435/ctx-10.html

Romance mediúnico: arte ou engano?

Os romances dominam a prateleiras das livrarias
Os romances dominam a prateleiras das livrarias

A abundância de romances mediúnicos é sinal de qualidade, alta, baixa ou média? Uma resposta imediata a perguntas desse tipo é não! Nem a abundância nem a exiguidade são, em si mesmas, sinal positivo ou negativo, apenas uma questão de verificação quantitativa.

Um outro fator, aí, pode ser relacionado: o tipo fenomênico – a psicografia – como fonte de obras literárias assinadas por individualidades invisíveis, em franca expansão e se destacando dos demais tipos, até mesmo acobertando-os. Tem-se a impressão – verdadeira ou falsa? – de que a mediunidade tornou-se sinônimo de psicografia, tal a quantidade de obras e mensagens esparsas produzidas por essa via.

Ontem (quatro de janeiro de 2014), estive por alguns instantes em diminuta livraria do Aeroporto dos Guararapes, Recife, tempo suficiente para perceber e registrar (foto acima), entre livros de autoajuda econômica, financeira e psicológica inúmeros romances mediúnicos em posição paritária de destaque.

Confesso, não conheço nenhum deles e sequer sabia de sua existência, portanto, nada tenho a comentar sobre qualidade literária ou mediúnica dessas obras. Mas elas estão lá, foram editadas, publicadas e vendidas. Não se pode desconhecer isso.

A questão da qualidade é diferente da questão do gosto, pois não é este, o gosto, que garante a qualidade de uma obra literária. Sabe-se, perfeitamente, que inúmeras obras literárias, mediúnicas ou não, de qualidade atestadamente ruim são campeãs de vendas aqui, no Brasil, e mundo afora. No caso dos romances mediúnicos, a qualidade não se restringe às questões literárias, simplesmente, mas incluem a própria condição de recepção mediúnica como um fator relevante a qualquer análise.

E deixa ainda no ar uma outra indagação que tem sido feita ao longo dos tempos por pensadores espíritas: o romance mediúnico é capaz de oferecer noções concretas de doutrina espírita? Aqui não é difícil refletir: um leitor neófito, aquele que não conhece com segurança as obras básicas não será capaz de recolher dessas obras ficcionais uma visão minimamente clara dos princípios que norteiam o espiritismo. Já não ocorre o mesmo com um leitor experiente, com boa base doutrinária: este poderá construir uma análise da obra e julgá-la em seus diversos aspectos, inclusive aqueles que eventualmente estejam em divergência com esses mesmos princípios.

Quando um romance mediúnico alcança a condição de obra alinhada com o pensamento espírita passa, automaticamente, para a relação dos bons livros. Mas quando o seu conteúdo sofre contestações por conta de licenças literárias danosas ou pontos de vista que vão de encontro aos princípios doutrinários entra em cena o processo de recepção mediúnica. Por que? A razão é simples, conquanto pouco percebida: o médium tem participação ativa, direta, na construção do discurso ou texto final e, sendo assim, parte maior, menor ou total da qualidade da obra pode ser-lhe atribuída.

Não se trata de um tribunal acusatório, de condenação do médium. Trata-se, acima de tudo, de levar em consideração a participação mediúnica do intermediário, daquele que se coloca entre o espírito autor e o leitor, participação essa considerada por Kardec da máxima importância e no caso específico do fenômeno psicográfico a particularidade de o médium atuar como intérprete do espírito se acentua e torna-se decisiva para o produto final.

Ao falar em interpretação estamos nos referindo ao fato de haver alguém – o médium – que se coloca entre as ideias do espírito autor e as ideias do leitor, exercendo uma função que não é apenas “técnica”, ou seja, que não se circunscreve a “receber” um texto pronto e colocá-lo no papel, mas é eminentemente interpretativa; o médium necessita de entender as ideias que lhes são trazidas e precisa passá-las adiante, de forma codificada, textual.

Trata-se de um processo complexo, no qual o médium experimenta o desafio de “traduzir” de uma linguagem para outra aquilo que lhe chega como ideia, demandando, portanto, conhecimentos, repertório, habilidade de lidar com a língua e, não raro, vivências passadas e presentes.

Quanto ao fenômeno da psicografia e sua ascensão a sinônimo de mediunidade, é um caso para se pensar. Mas é fato que a psicografia vem ocupando cada vez mais espaço no cenário mediúnico e, curiosamente, vai se tornando um fenômeno caseiro, ou seja, dado que muitos centros espíritas não dispõem de infraestrutura doutrinária e psicológica para oferecer aos médiuns, estes acabam, em boa medida, se recolhendo aos seus lares e ali, distantes do convívio com outros médiuns, realizam seu trabalho. E se têm um bom texto, não encontram dificuldades para publicar seus livros, pois, de um lado há um público ávido desse tipo de obra e, de outro, editores e clubes de livros também ávidos por publicar e disponibilizar a literatura mediúnica ficcional.

De Evangelho, comemorações e religiosismo

Sérgio, o meu inquisidor paulista, às vezes aproveitador contumaz das fraquezas humanas embora, ele próprio, de coração bom, toma o ano de 2014 para questionar – ou melhor, confirmar sua opinião – de que, quer queira, quer não, o Espiritismo tornou-se uma religião cristã a caminho de uma equiparação com os evangélicos e os católicos. E para justificar sua visão, diz-me aos ouvidos que tudo no movimento espírita está centrado na figura de Jesus e, se quisermos comprovar, até mesmo a música que se diz espírita, afirma ele, não passa de uma caricatura da música Gospel.

Como se não bastasse ter de aguentar o Sérgio, meu amigo da onça de outras existências muitas, tive que ouvir exatamente o inverso, ontem, de um amigo pernambucano, o Veríssimo. Ligou-me e durante uns bons minutos dos mais de oitenta que passamos no celular ficou ele me questionando porque sou contra o Cristo no Espiritismo. Pode, isso? Diz ele que nunca me viu falar em Jesus e que precisamos colocar Jesus na pauta, pois o Espiritismo privilegia o sentimento e sem Jesus não há sentimento.

A todos os que me questionam, dou a mesma resposta: minha posição no assunto é haurida na fonte piresniana: o Espiritismo não é, isoladamente, filosofia, ciência ou religião, mas um conjunto em que os três aspectos se firmam e se conjugam, formando um sistema de partes integrantes e inseparáveis. Não faz sentido, portanto, pensar o Espiritismo como uma filosofia separada dos outros dois aspectos, como não faz sentido também pensar o Espiritismo como uma religião que se sustenta por si mesma, à parte dos dois outros aspectos. E mais: não se pode pensar em religião sem ter bem claro que o conceito de religião no Espiritismo é outro, distante, muitíssimo distante, das práticas e dos comportamentos tradicionais. Falando claramente, o Espiritismo promove a ressignificação do sentimento religioso.

Se me refiro a Herculano Pires, devo trazer para o debate sua noção de virilidade como virtude do espírito evoluído, virilidade no sentido de força, energia, disposição e capacidade de julgar com justiça e liberdade. O ser viril de Herculano não se coaduna com o ser frágil que por temores incutidos por uma cultura religiosa tradicional se deixa prender às práticas e aos comportamentos que outra coisa não são que a repetição de um passado que o Espiritismo supera.

Meu amigo Veríssimo no seu preconceito não entende que alguém possa admirar o Cristo sem precisar estar se referindo a ele constantemente, pois, no cotidiano de Veríssimo o Cristo é reverenciado desde a primeira hora do dia à última, de forma expressa e cabal. Mas é para isso que Herculano chama a atenção, ao referir-se aos espíritas de sacristia como almas frágeis, ainda presas às práticas exteriores e aos temores. Herculano privilegia o Cristo da conversa com a samaritana junto ao poço de Jacó, que aponta para o futuro quando Deus será adorado em espírito e verdade, ou seja, no silêncio da intimidade e no exercício pleno do amor.

Tenho que dar razão ao Sérgio quando me diz que 2014 tende a aumentar o apelo ao nome de Jesus, uma vez que o ano traz a marca do sesquicentenário do “Evangelho segundo o Espiritismo”. Tudo caminha para uma centralidade – diz ele – na representação e não na análise criteriosa da mensagem do Cristo com base na relação do “Evangelho segundo o Espiritismo” com as demais obras da codificação, como quer Herculano.

A exacerbação do sentimentalismo contradiz com o sentimento sereno. A Coca-Cola é consumida muito mais pelo excesso de mensagens do que por suas propriedades alimentares. Uma excessiva campanha em cima do nome de Jesus sem a contraparte da racionalidade oferecida por Kardec tende a refletir-se numa confusão sem proveito para o crescimento do espírito.

Kardec é razão, diz Herculano, na certeza de estar referindo-se ao fato de que o amor, na sua expressão maior, é a síntese e o suporte da ciência, da filosofia e da religião. Os três aspectos em seu conjunto e não isoladamente.

Desaparecer? Não para sempre

O Espiritismo decretou: a morte não existe. Mas num universo planetário multicultural o decreto soa como peça conflituosa, pois se já não há espaço para decretos unilaterais em qualquer assunto político ou social, há que se considerar que a simples declaração de um valor que altera qualquer outro vigente – não raro, dominante – choca-se contra o muro das lamentações.

Recente estudo científico põe em cheque a morte cerebral[1], ao revelar que o encefalograma que determina a morte pode ser subvertido com uma nova espécie de coma e, em muitos casos, fazer voltar as atividades cerebrais. Ou seja, quando o indivíduo é dado como morto pela espada de Dâmocles do encefalograma, pode na verdade ainda estar vivo, o que, confirmado, demonstra que o a terrível imagem da linha contínua não é ainda a última palavra para a cessação da vida do corpo.

Ernesto Bozzano juntou inúmeros estudos e casos em um livro que Werneck traduziu para o português e construiu uma planilha com os principais fenômenos comuns quando da morte do corpo físico. Admirado e refutado, Bozzano e seu interessante “A crise da morte” tem sido muitas vezes confirmado com novos documentos mediúnicos e casos de pacientes que retornam do leito de quase morte e falam de lembranças de experiências vividas enquanto o corpo encontrava-se em coma profundo.

Um aparelhinho, de nome Tikker, dado como em desenvolvimento final, pretende calcular o ano, dia e a hora em que o corpo deve morrer e por isso já foi apelidado de “relógio da morte”. Seus inventores têm uma opinião diferente e afirmam que o aparelho servirá para os indivíduos melhor planejarem suas ações na vida e realizá-las a tempo, ou seja, antes que o dia final chegue.

Posto em discussão num grupo de espíritas, três entre quatro indivíduos disseram que não usariam o relógio. Preferem manter no escuro a luz da passagem para que o momento final chegue da mesma forma que ocorre a milênios, isto porque não basta acreditar que a morte é uma passagem e o desaparecimento da personalidade não é para sempre; é preciso ter condições sócio-psicológicas – Herculano Pires diria: educação – para enfrentar a morte sem temor e, se possível, com satisfação.

A cultura da vida e a contracultura da morte se debatem. A ideia de vida é complexa, tanto científica quanto culturalmente e os olhos do homem passeiam pela paisagem planetária numa perdida busca de respostas para a questão. Cada um formula o seu modo de crer, seja para o nada, seja para o existir, mas quando a morte deixar de ser um decreto e passar a constituir uma certeza, teremos substituído uma cultura de fundamental significado para um todo que se chama felicidade.

Os relógios que permanecem marcando apenas a hora já perderam o seu significado e se tornaram um elemento de adorno para o braço. A convergência digital é a pretenciosa busca da unidade e, incorporando ou não o objetivo do Tikker, caminha a incrível velocidade para dotar o ser de vida e de morte, pois sempre que revela uma arrasta consigo a outra. É inevitável. Ocorre que quando uma tecnologia perde significado, desaparece para sempre e só os homens de história se lembram dela, mas o ser humano pode ser uma realidade contínua. Depende dele.

O sonho (impossível e desnecessário) de um Espiritismo planetário

O desejo de um Espiritismo adotado por toda a sociedade humana, apesar de toda a utopia que contém, não se restringe unicamente aos objetivos das grandes instituições espíritas (federativas e similares). Ele pode ser, na verdade, localizado como ponto de origem no indivíduo. As preocupações em escala macro se vinculam ao micro, vale dizer, o que ocorre nos centros espíritas se estende às federativas e vice-versa.

Cabe, portanto, discutir as questões importantes sob o prisma de seu alcance, sempre tendo por perto essa ideia de que o centro espírita é ponto de partida delas. Ai se inclui esse desejo, essa aspiração, que parece existir em cada um dos adeptos do Espiritismo e, consequentemente, é incorporada aos centros espíritas, de ver sua doutrina colocada em um plano de divulgação tal que alcance os mais distantes setores da sociedade, através de uma mensagem com alto teor de persuasão. A intenção, bem se vê, é conquistar mentes e corações e nela está embutida a ideia de que a adoção dos princípios e conceitos espíritas fundamentará a transformação da sociedade (para melhor, é claro), de modo irretorquível como não o faria nenhuma outra filosofia existente.

Há um sentido subjacente aí que merece ser anotado: considerável parcela de espíritas parece entender que a filosofia que a alcançou com certa força de profundidade fará idêntico trabalho no outro, desde que esse outro possa tomar ciência dela como estes adeptos o fizeram, algo mais ou menos como aquilo que foi bom para mim será inevitavelmente bom para as demais pessoas. Isso parece reforçar um certo descontentamento perceptível de que o que está de fato faltando é uma divulgação eficiente do Espiritismo.

Muitos adeptos e centros espíritas transferem para as instituições representativas uma como que obrigação de cuidar dessa divulgação em larga escala sem perceber que a transferência é muito mais simbólica do que objetiva. No fundo, a utopia de um mundo espírita, que permeia nossa gente, age de tal maneira em cada um que muito do que se faz nos nossos centros não é mais do que a tentativa de materializar o desejo. Diante dos frequentadores – e destes entre si – os dirigentes buscam uma eficiência comunicativa da mensagem como o fariam se o meio fosse outro e o público compusesse um universo massivo, não sendo demais imaginar que estarão dotados nestes momentos de uma forte esperança de que os receptores sejam mais do que meros receptores, mas verdadeiros agentes de disseminação da doutrina, fundamentando assim a ideia de que representam mais do que a si mesmos, mas a grande sociedade mundial. O destino da mensagem é, pois, o público presente, em número reduzido, e o ausente, a grande massa.

Questões técnicas referentes à mensagem e de conteúdo doutrinário são passíveis de questionamento e análise, merecendo um capítulo à parte. Entretanto, é preciso considerar com uma certa justeza que nem o sonho nem seu conteúdo utópico devem constituir preocupação; vivemos repletos de sonhos no dia a dia, alimentando-nos dos estímulos que eles produzem. A questão principal está em perceber: l. o grau de impossibilidade de materialização do desejo; 2. A sua importância secundária para o Espiritismo; 3. O que o desejo significa em termos de influência sobre a mensagem doutrinária que se constrói no centro.

O terceiro item é de longe o que mais atenção deve despertar, uma vez que se podem prever algumas influências positivas e negativas decorrentes do desejo. Entre as negativas estaria a apropriação de um sentido de superlativação do próprio Espiritismo, podendo isso conduzir os adeptos a atitudes próximas do fanatismo, contaminando assim a mensagem de divulgação doutrinária. Ao assumir o Espiritismo como uma doutrina completa e provida de todo o conteúdo necessário ao ser humano, sem mais necessidades e nenhum aspecto a ser desenvolvido, o adepto se submete a uma postura enganosa e necessariamente prejudicial à divulgação da filosofia.

Qualquer estudo que se assente no bom senso conduz à percepção de que é impossível persuadir toda a sociedade para uma só mensagem. Mesmo se dispuséssemos de todos os canis de comunicação disponíveis no mundo e de todo o arsenal tecnológico existente seria humanamente impossível construir uma mensagem capaz de ser recebida de modo semelhante e com um grau de persuasão favorável em pessoas diferentes culturalmente.

Mas é preciso perceber também que este objetivo, almejado por adeptos e instituições, tem pouco significado real para o Espiritismo, afinal, nenhuma doutrina expressiva, para ser reconhecida, pode assentar-se na quantidade de pessoas que a adotam. Se os números podem ter alguma representatividade, eles, entretanto, não podem estar acima dos fundamentos filosóficos e científicos de que a doutrina é dotada.

(Publicado originalmente em Dirigente Espírita no 64 de março/abril de 2001)

Herculano estuda os cinco livros da codificação de Kardec

selo_encart_wwwEis aqui um documento importante para o estudioso do Espiritismo, datado de 24 de agosto de 1974. J. Herculano Pires – cujo centenário de nascimento está sendo comemorado a partir de 25 de setembro de 2013 – em palestra para espíritas faz uma abordagem dos principais livros escritos por Allan Kardec com o objetivo de destacar a importância do seu estudo e das correlações dos diversos temas que os livros abordam. Vazada numa linguagem coloquial, familiar, onde a intenção do diálogo se sobressai como verdadeiro convite à conversa ao pé do ouvido, Herculano mostra sua particular preocupação em olhar para a codificação em seu conjunto como forma de poder integrar-se nela e descer às suas reais profundezas.

Todo o texto resulta de um trabalho longo e paciente de decupação de fitas magnéticas onde a palestra foi gravada, mantendo a coloquialidade da conversa, fator esse que permite acompanhar o professor em sua “aula” e com sua forma peculiar de se relacionar com a plateia de modo próximo, espontâneo, em que busca trazer para perto de si aqueles que se encontram na condição de alunos.

O texto está sendo apresentado abaixo na forma como foi decupado. Fiz pequenos ajustes, apenas, como a introdução de subtítulos e a correção de alguns senões gramaticais, naturais em situações como a que o professor se encontra. A introdução de subtítulos visa tornar o texto um pouco mais explícito, por facilitar a divisão dos assuntos abordados.

Vale ressaltar que Herculano estuda os livros com os olhos voltados à particularidade de cada um e ao conjunto do qual fazem parte, ocasião em que realiza o enquadramento deles como obra relacionada à filosofia, à ciência ou à religião. É assim que deixa clara a sua natureza mas, também, as razões pelas quais entende o Espiritismo como doutrina fundamentalmente preocupada com o Espírito e voltada ao seu conhecimento.

O tom familiar da palestra não impede que Herculano apresente uma riqueza de informações impressionante, decorrente de sua constante atualização em relação ao conhecimento que se produzia à sua época mas, também – e disso devemos estar certos – resultante daquela bagagem que é inerente a todos os seres humanos multiexistenciais e que, nele, Herculano, surgia como que à flor da pele sempre que seu espírito se punha a comparar o novo com o velho, as tendências com a realidade, a parte e o todo.

Vejamos, portanto, a palestra de J. Herculano Pires.

O TOM, A PROPOSTA

Vamos então prosseguir na nossa conversa sobre a Doutrina, nós estávamos no campo do estudo doutrinário, né? Vocês se lembram que nós falamos sobre a necessidade de realmente estudar a doutrina a partir dos volumes iniciais de Kardec, passando depois pela a Codificação.

Le_Livre_des_Esprits_2A Codificação, como naturalmente todos se lembram, se constitui daqueles cinco volumes que apresentamos aqui. Primeiro O Livro dos Espíritos. O Livro dos Espíritos é a obra fundamental da Doutrina, portanto é um livro que nenhum espírita pode deixar de ler. Quer dizer, toda pessoa que realmente se interessar pela doutrina tem de ler este livro, tem de estudá-lo. Ele é um livro de estudo. Um dos companheiros de Chico Xavier lá em Uberaba certa vez perguntou a Emmanuel através do Chico: Emmanuel, eu já li O Livro dos Espíritos quinze vezes, o que que você me aconselha agora? O Emmanuel disse: Leia mais quinze.

Parece brincadeira mais é verdade. Por que? Porque O Livro dos Espíritos é um livro de síntese da doutrina. Então quem lê assim de fio a pavio, como se diz, lê mais ou menos no sentido de quem tá lendo uma leitura corrente sem muita preocupação. E com isto o livro engana, sem querer enganar. Por que? Porque é um livro escrito com muita simplicidade. Kardec era um professor, era um pedagogo, era um didata, era um homem que procurava ensinar da maneira mais clara possível. Ele mesmo diz nos seus livros que ele pretendia escrever as obras de maneira que não deixasse motivos para interpretações várias. Quer dizer, uma coisa que fosse dita, que estivesse clara, devidamente clara, para um não dizer não, ele disse isso, outro diz não, ele disse tal coisa. Então, o esforço dele nesse sentido foi um esforço de clareza. Ao contrário das pessoas que escrevem livros assim referentes a doutrina, a doutrinas várias, procurando apresentar várias complicações da doutrina, Kardec fazia o contrário, ele procurava reduzir as complicações e deixar o texto bem claro, bem preciso, para que não houvesse dúvidas, não houvesse controvérsias inúteis, para que tudo se tornasse enfim bem inteligível, a pessoa leu e compreendeu.

LIVRO INADEQUADO PARA LEITURA DINÂMICA

Entretanto, quando se faz isso também se corre um outro perigo, que é o da pessoa passar muito por cima do assunto sem prestar atenção. E o nosso hábito de leitura, principalmente aqui no Brasil, é um hábito de leitura muito descuidado, nós corremos os olhos e lemos rapidamente, quanto mais rápido melhor. Agora ainda apareceu ai essa leitura que se chama dinâmica, que é um negócio né? Muita gente pensa que com aquilo pode ler uma obra como O Livro dos Espíritos, e lê e não entende nada, é lógico, fica na mesma, né? Por que? Porque a leitura dinâmica é muito boa como informação para, como por exemplo num escritório comercial, na atividade de um industrial, de um homem que está lidando com muitos problemas, poder ao mesmo tempo se inteirar de vários aspectos da correspondência que chega. Isso é muito bom, porque abrevia o tempo e ele logo, os assuntos não são tão complexos, são objetivos ele vê logo com rapidez do que se trata. Mas para uma leitura de um livro como O Livro dos Espíritos não serve.

O Livro dos Espíritos tem certa semelhança, até parece que eu disse isto aqui mas convém repetir, tem certa semelhança nesse aspecto com o Discurso do Método de Descartes. Descartes foi mesmo um precursor do Espiritismo, como já tivemos ocasião de dizer aqui.  Para começar, para se lembrar de que ele foi um precursor, basta lembrar o seguinte, ele se dizia, ele se achava, se considerava inspirado pelo Espírito da Verdade. E de fato quando nós lemos a obra de Descartes nós vemos que ele encaminhava o seu pensamento na direção dos problemas espíritas. E Descartes então escreveu o Discurso do Método com muita simplicidade. Quem lê, pega o Discurso do Método pra ler do começo ao fim, diz: é um livro fácil. Não é; é um livro muito complexo. Basta dizer que Etienne Girson, que é um filósofo francês, escreveu [aqui, Herculano parece pegar um exemplar de um livro qualquer e comparar]: o Discurso do Método é menor do que isto, é um livrinho de poucas páginas, mais ou menos assim. Etienne Girson escreveu um livro desta grossura, quase mil páginas, impresso em tipo miúdo numa edição francesa, para explicar o Discurso do Método, para explicar, para tornar compreensível o Discurso do Método. Então, a gente vê quanta coisa Descartes abordou de maneira simples, sintética no seu Discurso do Método. É preciso a pessoa penetrar naquilo, ler com atenção, porque senão muitos dos princípios estabelecidos por ele passam desapercebidos.

N’O Livro dos Espíritos é a mesma coisa, a mesmíssima coisa, nós começamos a ler o livro com muita simplicidade e vamos lendo correntemente e as coisas vão passando sem a gente perceber. As vezes uma frase tem um sentido mais profundo do que aquilo que aparece à primeira vista, nós temos de penetrar no sentido da frase, e além disto precisamos estabelecer ligações entre os vários assuntos. São numerosos assuntos tratados num capítulo. Por exemplo, é preciso ligar esses assuntos entre si para a gente chegar a uma compreensão global. Eu não posso, por exemplo, destacar um texto d’O Livro dos Espíritos, como faz muita gente, principalmente os que combatem o Espiritismo usam muito essa técnica. Destacam uma frase de Kardec ou um pequeno texto, interpreta aquilo isoladamente do contexto geral, e então levantam problemas que não existem, problemas que são inteiramente estranhos à obra. A necessidade, portanto, é de uma leitura de conjunto, uma leitura atenciosa para a gente poder compreender o conjunto do que Kardec está dizendo. E também ver mais fundo do que aquilo que nos aparece de primeira vista, porque há problemas ali bastante sérios.

Por exemplo, há pessoas que dizem assim. N’O Livro dos Espíritos Kardec não disse nada, não estabeleceu nada sobre o processo da evolução geral, essa evolução que vem desde o mineral até o homem, e que vai além do homem no plano espiritual. Então, esse princípio não é do Espiritismo, dizem várias pessoas. No entanto, se pegar na pergunta 540 d’O Livro dos Espíritos lá está bem claro que a evolução vai desde o átomo até o arcanjo que também já foi átomo. Quer dizer, nada mais claro do que isto, é preciso, o processo da evolução está bem figurado nessa expressão rápida de Kardec. Noutros lugares Kardec diz constantemente, Kardec e os Espíritos que ditaram várias partes do livro, tudo se encadeia no universo, quer dizer, não há solução de continuidade, não há interrupção nas ligações do universo. O universo é um organismo, este organismo é constituído portanto de várias partes, mas todas elas entrosadas, todas elas encadeadas. É por isto que nós vemos a evolução partir do reino mineral, passar para o reino vegetal, para o reino animal, para o reino hominal e depois para o espiritual. É continua a evolução, é uma corrente.

Assim nós vemos também em todos os demais aspectos do universo. A evolução funciona desta mesma maneira, tudo no universo está interligado. Nós temos a Terra em que vivemos, a Terra pertence a um sistema solar, entretanto este sistema solar pertence a uma constelação, a uma galáxia que é um universo, como dizem os astrônomos, um universo ilhado, separado no espaço, cercado por grandes espaços desertos, vazios, mas lá pra frente nós encontramos outra galáxia, lá para frente outra e assim por diante. Então todo os astros, todas as constelações, todas as galáxias, todos os universos se entrosam num grande sistema que é o Cosmo, o Cosmo abrange tudo. É esta a visão de conjunto que o Espiritismo nos dá quando nós estudamos esses problemas.

Então é necessário quando ler O Livro dos Espíritos, ler com atenção e vendo sempre o problema do conjunto. Kardec diz também continuamente o seguinte: os homens em geral veem as coisas apenas por um ângulo da natureza. Olhando por um ângulo da natureza só se tira a conclusão daquilo que se viu, não se tira conclusão do conjunto. O Espiritismo procura nos fazer ver o conjunto da natureza, o conjunto geral para nós termos uma ideia mais aproximada da realidade, da verdade. Ora, O Livro dos Espíritos como nós dissemos foi dividido por Kardec, dividido não, foi projetado por Kardec em outras obras, né?

O ASPECTO FILOSÓFICO

Então, a primeira obra que aparece depois da inauguração d’O Livro dos Espíritos é O Livro dos Médiuns. Por que? Porque se n’O Livro dos Espíritos nós temos uma síntese geral da doutrina, justamente por isto nós temos ali o aspecto filosófico da doutrina. Por que? O ramo do conhecimento que nos oferece uma visão global das coisas não é a ciência, é a Filosofia. A ciência é sempre específica, a Biologia, a Química, a Física, todas as ciências tratam cada uma de um aspecto da natureza. Portanto, não tratam da natureza em geral, cada uma delas se dedica a um aspecto. A Filosofia não é assim, a Filosofia é uma concepção geral do universo, então ela é o conhecimento geral. No desenvolvimento das ciências, fragmentando-se cada vez mais, inclusive se subdividindo nas técnicas, neste desenvolvimento o saber humano como que se fragmenta, se espedaça, se espalha. Então, o elemento de unidade desse saber é a Filosofia. Por isso que recentemente com o grande desenvolvimento das ciências, apareceu aquilo que chamamos de Filosofia das Ciências. Porque a filosofia das ciências tem a finalidade de reunir todas as conquistas das ciências e apresentá-las numa visão filosófica geral.

Então por isto O Livro dos Espíritos é um tratado filosófico. Muita gente contesta isto. Não faz muito tempo o Professor Humberto Rhoden, que na verdade foi uma grande figura do clero católico no Brasil, hoje ele é conhecido como professor mas ele era um sacerdote católico de grande projeção no clero brasileiro, e que até foi nos Estados Unidos onde lecionou em várias faculdades norte americanas como professor de filosofia, este homem deu uma entrevista à imprensa e disse assim: “Não vejo filosofia espírita em parte alguma, aquilo que está n’O Livro dos Espíritos não tem relação nenhuma com  filosofia”. Ora, isto na boca de um professor de filosofia que se projetou até no mundo é um absurdo de de estarrecer. Por que? Porque a Filosofia não se caracteriza por elementos formais, por forma. Ela tem processos, processo de pesquisa, processo de cogitação, de perquirição mental, tem os seus métodos, mas ela não se define por uma forma definida, caracterizada, precisa, por uma sistemática rígida, nem pode se caracterizar, porque a sua finalidade é a expansão do pensamento no sentido de abranger o todo. Então ele negou que O Livro dos Espíritas tivesse qualquer coisa de filosófico. Ora, começa que O Livro dos Espíritos coloca os problemas filosóficos fundamentais. O problema da vida, o problema do ser que é o problema fundamental da filosofia, o problema das relações do homem com Deus que é filosófico embora seja também religioso, o problema da existência do universo, a cosmogonia ou seja o problema da criação do mundo, do universo. Todos os problemas enfim que se relacionam com o homem e a sua vida dentro da terra em relação com o universo, todos esses problemas estão colocados lá. Os aspectos sociológicos que O Livro dos Espíritos trata, de que ele trata, são aspectos também relacionados profundamente com os problemas filosóficos. Então negar que O Livro dos Espíritos seja um verdadeiro tratado filosófico, é querer mostrar uma coisa pelo avesso, querer desfazer uma verdade que está patente.

Mas como parece que as coisas são assim, quando acontece um estouro, um absurdo, logo em seguida vem uma emenda que a gente não espera. Logo que o professor Humberto Rhoden disse isso numa entrevista à imprensa, a editora da livraria francesa, a Difusão Europeia do Livro, traduziu aqui no Brasil e publicou um livrinho de Yvonne Castelan. Yvonne Castelan é uma escritora francesa, uma professora. O livrinho se chama O Espiritismo. E logo no início do livrinho o que diz a Yvonne Castelan. “O Livro dos Espíritos é um perfeito tratado de filosofia.” Então ela examina as várias partes do livro, né, para chegar a cloncusão de que O Livro dos Espíritos é realmente um tratado de filosofia que apresenta a Filosofia Espírita. Quer dizer, a resposta foi dada ao acusador por uma tradução que veio de fora, lá da França, trazendo a resposta.

O LIVRO DA CIÊNCIA ESPÍRITA

210px-Le_Livre_des_MédiumsSendo assim O Livro dos Espíritos numa visão de conjunto da doutrina, ele precisava ser desenvolvido em outros livros. Então logo a seguir aO Livro dos Espíritos vem O Livro dos Médiuns. O Livro dos Médiuns é praticamente o livro da ciência espírita, o livro da ciência. Por que? Porque ali Kardec trata cientificamente da investigação dos fenômenos, da metodologia a seguir para a pesquisa espírita, e ao mesmo tempo oferece as teorias explicativas dos fatos, dos fatos mediúnicos de todas as formas, tanto os da simples comunicação quanto os da materialização, o da aparição, da materialização, da movimentação de objetos e assim por diante. Então O Livro dos Médiuns é a parte científica do Espiritismo colocado também no sentido de fundamento dessa parte. Quando se lê bem O Livro dos Médiuns chega-se a uma conclusão muito interessante que Kardec já deixou n’O Livro dos Espíritos, mas que só lá é que vai se completar. O que é a Ciência Espírita? Muita gente pergunta, o que é a Ciência Espírita? Muita gente pensa que a ciência espírita seja uma espécie de parapsicologia, uma espécie de metapsíquica. Não é nada disso. A Ciência Espírita, diz Kardec, é a ciência do espírito. Porque existem as ciências da matéria, são várias, numerosas as ciências da matéria. Mas não existe uma ciência do espírito. No tempo de Kardec, principalmente, quando a Psicologia devia ser a ciência do espírito ela já estava se desviando do campo propriamente anímico, do campo da alma que ela devia estudar, para entrar no campo experimental, tratando da psicologia no sentido de simples relação do indivíduo com o meio. Tratando do comportamento humano, que é o que faz até hoje. Então a própria psicologia já saía do campo do espírito, em que ela havia nascido, porque nós falamos que psicologia quer dizer estudo da alma, pesquisa da alma, né. Saía desse campo para entrar no campo também da investigação material, das relações do homem, do sujeito, do indivíduo com o meio em que ele vive, com o seu comportamento social, essas coisas todas que no final não correspondem a uma pesquisa do espírito, o espírito ficou esquecido. E realmente a psicologia experimental reduziu a psicologia apenas aos fenômenos materiais do homem. O problema da sensação, das emoções, das reações do homem aos estímulos que vem de fora para ele, né. Tudo isto reduziu a este campo. Então sendo a psicologia também uma ciência que se voltou para a matéria o espírito ficou abandonado. O espírito ficou na mão das religiões.

Então só havia como autoridade para falar sobre o espírito, haviam os grandes sacerdotes, os representantes das grandes religiões que eram os incumbidos disto, só eles podiam falar disto, tratar disto, porque os outros não entendiam nada e nem queriam entender. Os cientistas achavam que este problema de alma, de espírito, de sobrevivência após a morte era um problema que devia competir apenas às religiões, eles não queriam saber disto. Então Kardec diz, não mas o problema não é este não. A existência do espírito e a sua sobrevivência estão integrados na própria natureza. Se as ciências tem por finalidade estudar a natureza e revelar-nos a verdade sobre os processos naturais, se ela busca conhecer a realidade ela tem que cuidar do espírito também. Mas como não havia ciência pra cuidar disso, ele disse o Espiritismo funda a ciência do espírito. E fundou mesmo. A ciência do espírito. Então, esta ciência do espírito parte da manifestação do espírito, só tem que partir disto, nós não podemos estudar o espírito no plano puramente abstrato. Não podemos nos afastar da realidade em que nós vivemos para mergulhar no infinito e estudar o espírito lá. Então, a ciência do espírito tem de se apoiar nas manifestações do espírito. Estas manifestações do espírito são dadas, como sabemos, através de toda a fenomenologia mediúnica, através das manifestações mediúnicas. Então nós temos esse campo como o campo de pesquisa da ciência espírita. Mas diz Kardec, o objeto da ciência espírita é o espírito, não é portanto os fenômenos em si, é o espírito.

Para termos uma ideia do que seja a ciência espírita podemos ver, não só n’O Livro dos Médiuns como também no livro O Céu e o Inferno de Allan Kardec, na última parte do livro, as pesquisas feitas por ele com relação ao estado, a situação dos espíritos depois da morte. Quer dizer, ele então investigava os espíritos através da mediunidade, mas tendo como objetivo principal saber o que era o espírito, como o espírito sobrevivia ao corpo, como ele permanecia e vivia no mundo espiritual, o que ele faz no mundo espiritual, qual é o seu destino, tudo enfim que se relaciona com o espírito. Quer dizer, os fenômenos são apenas a porta de entrada da ciência espírita, apenas o elemento que facilita a pesquisa.

Eu estou dizendo isto porque é bom a gente conhecer bem este assunto para não fazer confusões. Por exemplo, muita gente diz assim. A parapsicologia está suplantando o Espiritismo. Não é verdade, a parapsicologia até agora só confirmou o espiritismo. O Padre Quevedo por exemplo diz. A parapsicologia matou o espiritismo, não existe mais nada. Mentira do padre, ele não devia mentir mas mente. Mentira porque ele sabe que não é assim. Ele sabe, ele tem estudado o assunto e ele sabe que não é. Quer dizer, a parapsicologia só tem confirmado o espiritismo. Até hoje, nenhuma pesquisa da parapsicologia, da parapsicologia moderna, nenhuma pesquisa dela derrubou um único princípio espírita, nenhum. Não é extraordinário isto? Desde 1930 quando começou a pesquisa parapsicológica nos Estados Unidos, até hoje não houve nada na parapsicologia que derrubasse um só princípio do espiritismo. Pelo contrário, todos os princípios foram confirmados.

Os que querem combater o espiritismo alegam então: não, mas tal cientista diz que pode explicar isto da seguinte e seguinte maneira. Bom, o cientista disse baseado numa teoria, numa hipótese que ele formulou. Mas o que nos interessa não são as hipóteses, são os resultados da pesquisa. E essas hipóteses que são citadas contra o espiritismo forma todas derrubadas pela pesquisa, a pesquisa não as comprovou. Então são hipóteses que não tinham valor, hipóteses apenas como instrumento de trabalho, apresentadas como uma orientação para pesquisa para ver se conseguia confirmar naquele campo, naquele ponto. Por exemplo, um indivíduo diz assim: não é espírito que se manifesta, é o próprio espírito do indivíduo, do médium que está falando. Então esta é uma hipótese, é uma hipótese que foi colocada, vamos estudar, vamos pesquisar. A pesquisa feita provou o contrário. Quer dizer, se provou o contrário a hipótese caiu, não existe mais. Eles então alegam baseando-se nessas hipóteses que não existem, foram derrubadas pela pesquisa. Mas a pesquisa até agora só fez confirmar.

Então a ciência do espírito não se preocupa especialmente com os fenômenos. Ela se preocupa principalmente com a verificação da situação dos espíritos, da sua condição de vida, da maneira porque eles se encarnam e desencarnam, tudo isto é problema da ciência espírita. Atualmente como nós sabemos as próprias ciências físicas estão entrando neste terreno. Mas por que estão entrando? Porque são obrigadas a entrar. Ao investigar a matéria por exemplo, os cientistas chegaram a que conclusão? Que a matéria era densa, compacta, impenetrável, que a matéria por isso mesmo tinha a sua consistência própria e que ela não podia se relacionar com nada daquilo que se atribuía a ideias abstratas, a pensamentos abstratos. Pois bem, a investigação da física levou a descoberta de que a matéria nada mais é do que, segundo a expressão de Einstein, uma condensação de energias. Energias que se condensam e produzem algo que parece para nós opaco, concreto e ao mesmo tempo impenetrável. No entanto é apenas uma condensação de energia. Quer dizer, se nós víssemos através de um aparelho especial, eletrônico, a constituição de uma tábua por exemplo, ou de uma pedra, nós veríamos que há dentro dela grandes espaços vazios que nós não percebemos. Na constituição da matéria ela não é opaca, não é compacta como aparece para nós, a aparência é uma coisa a realidade interna é outra. A teoria atômica veio mostrar que existe mais espaços vazios dentro da matéria do que espaços concretos. Quer dizer, os átomos constituindo verdadeiras constelações com grandes espaços vazios entre as partículas atômicas e o núcleo né, os átomos estão mostrando o vazio que existe dentro da matéria que para nós parece absolutamente densa. Então nesta investigação da ciência, a ciência teve de penetrar num campo diferente, teve de ir além da matéria, porque ela por assim dizer desfez a matéria ou a matéria se desfez na mão dos cientistas, né. E a conclusão foi a descoberta da antimatéria, quer dizer, além da matéria apareceu uma outra coisa que é a antimatéria. E esta antimatéria para nós que estamos sempre falando no outro mundo que eles negam, essa outra matéria se apresentou para eles como sendo o outro mundo. Sim, o outro mundo. Porque todos os elementos químicos que existem aqui no nosso mundo, existem na antimatéria, só que constituídos de uma constituição diferente da nossa, diferente apenas na posição e na situação dos átomos e das partículas atômicas. Por exemplo, os físicos soviéticos conseguiram obter em laboratório a elaboração de um anti-átomo de hélio, anti-átomo de hélio. Existe o átomo de hélio no nosso mundo, no mundo da matéria. Um anti-átomo de hélio no mundo da antimatéria. Este anti-átomo tem todas as partículas que tem o átomo de hélio, só que a posição, as cargas das partículas são inteiramente diferentes, são ao inverso das partículas da matéria. Quer dizer, então a antimatéria parece então como o avesso da matéria, segundo algumas expressões. Aparece como o avesso da matéria, mas ao mesmo tempo indispensável à existência da matéria.

Então existem dois mundo interpenetrados, é essa a teoria espírita, dois mundos interpenetrados, é o mundo espiritual e o mundo material. Mas a antimatéria não é o espírito. Então o que seria a antimatéria?  Para nós a antimatéria é o fluído universal, é o fluído universal de que se constitui o mundo espiritual mais próximo da terra, aquele que nós sabemos habitados por espíritos ainda revestidos de perispírito pesado, de corpo espiritual pesado, muitas vezes tão densos que quase se aproximam da materialidade. Então a pesquisa da própria ciência material acabou confirmando também um princípio espírita que a parapsicologia não podia confirmar porque não era do campo de pesquisas dela, foi confirmado pela Física. Atualmente como sabemos o avanço das pesquisas nesse terreno chegou a descoberta do perispírito, do corpo espiritual do homem né, que os cientistas soviéticos chamaram de corpo bioplástico ou bioplasmático. Então esse corpo também está confirmado pelas ciências, e pelas ciências físicas. Temos mais uma confirmação que seria muito difícil se obter na parapsicologia, mas que se obteve na Física e na Biologia, porque biólogos e físicos estão empenhados no estudo disso.

O problema da morte por exemplo, também as comprovações científicas no campo dessa pesquisa dos físicos e biólogos é absoluta, quer dizer, eles verificam no momento em que o moribundo está morrendo eles conseguem verificar através das chamadas câmaras Kirliam de fotografia da antimatéria, eles conseguem ver e fotografar a saída dos elementos vitais do corpo humano constituindo depois um corpo que é o corpo que eles chamam de bioplasmático que é o perispírito. Este corpo se retira completamente do corpo material e só quando ele se retira o corpo vira cadáver, antes disso ele não vira. Quer dizer, então nós vemos que as comprovações foram decisivas neste terreno.

Mas a ciência espírita ela trata como já dissemos não desses aspectos que pertencem a área de ciências né, a área de ciências que dividem os dois campos. Aqui nós temos por exemplo as ciências da matéria, aqui nós temos as ciências do espírito e aqui no meio nós temos a área das ciências intermediárias, que são metapsíquica, a área psicologia, ciência psíquica inglesa, e assim por diante, as várias ciências que estudam os fenômenos mediúnicos. Se temos aqui a matéria e aqui o espírito, temos aqui a mediunidade. Quer dizer, esta área das ciências que é ocupada pela Parapsicologia hoje, e pela Metapsíquica que ainda também subsiste, continua a se desenvolver. Então, esta área das ciências é a área que trata da mediunidade e não do espírito, mas esta área que é do Espiritismo é a Ciência do Espírito. Olha, então nós já vemos que a doutrina tem aspectos que a gente precisa compreender, prestando bem atenção no estudo porque se não nós podemos fazer confusões, né. Por exemplo, lá na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas um companheiro de Kardec propôs a ele certa vez. Vamos trabalhos de materialização aqui. Kardec disse acho que não, mas vou consultar o espírito guia. Consultou o espírito guia do trabalho e o espírito disse não. Materializações, efeitos físicos, essa coisa toda é para os cientistas, eles vão verificar isto, você trata do espírito, da pesquisa do espírito.

Então as pesquisas de Kardec a gente pode ver, principalmente no final do livro O Céu e o Inferno, e ver de maneira completa na Revista Espírita, a Revista Espírita em seus doze volumes da Revista Espírita, ali a gente vai encontrando as várias investigações feitas por Kardec, tudo publicado integralmente ali, com as manifestações dos espíritos, as respostas dadas a Kardec sobre as suas perguntas, mostrando como o espírito se sente no mundo espiritual, como inclusive o espirito de pessoas vivas, que foi uma pesquisa muito importante de Kardec, espírito de pessoas vivas durante o sono, quando estão dormindo se retiram e passam a viver no espaço. Então como esse espírito se sente no espaço, o espírito da pessoa viva, quais são as sensações que ele tem, tudo isto foi pesquisado intensivamente por Kardec, durante doze anos de pesquisas. Então aí nós temos a Ciência Espírita realmente e O Livro dos Médiuns é o livro fundamental dessa ciência.

A RELIGIÃO E O ESPIRITISMO

Evangile_selon_le_spiritismeO Evangelho Segundo o Espiritismo, que nós todos conhecemos bastante. Conhecemos… Quer dizer, bastante, he, he…, no sentido de ouvir falar nele, ouvir algumas leituras, ler um pouco, mas não de penetrar mesmo no miolo do Evangelho. Penetrando lá nós vamos ver que há também uma profundidade ali que nós não conhecemos ainda. O Evangelho Segundo o Espiritismo é aquilo que serve de base, é o livro básico da Religião Espírita. Mas isso não quer dizer que a Ciência Espírita possa se firmar só n’O Livro dos Médiuns. É Livro dos Médiuns e Livro dos Espíritos. A Religião Espírita: Evangelho Segundo o Espiritismo e Livro dos Espíritos. O Livro dos Espíritos é sempre a base de tudo, de todos os aspectos da doutrina.

Então no Evangelho nós encontramos a colocação dos problemas religiosos de maneira mais ampla e de maneira mais livre. O problema da religião é muito sério, muito complexo, pelo seguinte. Porque a religião que nasceu naturalmente com o homem primitivo, nasceu nas selvas. Nós sabemos que não há um só povo no mundo em todas as épocas da humanidade, de acordo com todas as pesquisas feitas, não há um só povo no mundo que fosse ateu, nunca houve. Até lá nas cavernas do homem primitivo existe os sinais de culto, de religião que eles praticavam. Todos os homens desde que apareceram na terra trouxeram com eles o sentimento religioso. Esse sentimento religioso gerou as religiões. Mas as religiões seguiram sempre um caminho formalístico muito perigoso, que era necessário, naturalmente. Quer dizer, tudo isto é um pouco difícil as vezes da gente compreender. Quando a gente acusa muito os organizadores de religiões de haverem organizado verdadeiras estruturas mundanas, comerciais, políticas, sociais da religião, quando acusamos isto nós esquecemos de que também as condições da época em que as religiões se formavam exigiam isto. As condições de próprio conhecimento do homem, o homem não tinha o conhecimento que ele tem hoje, então eles tinham que se entregar a certos sistemas que era a única maneira dele organizar a sua religião. Mas as religiões foram organizadas assim e por isso mesmo se tornaram fortes, poderosas. Porque elas aglutinaram muitos interesses humanos, interesses imediatos, interesses terrenos, e terminaram subjugando os interesses espirituais aos interesses terrenos. Vem daí o problema religioso no mundo.

Ora, Kardec se recusou até o fim da sua vida a chamar o Espiritismo de religião. Ele só concordou em fazer uma palestra na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, três ou quatro meses antes da morte dele para explicar porque ele não tinha chamado o Espiritismo de religião. E ele explicou. As religiões são estruturas formais, dogmáticas, portanto profundamente sistematizadas, que submetem as consciências ao seu domínio. O Espiritismo não é e não pode ser isto. O Espiritismo é um movimento livre, um movimento que não pode absolutamente estabelecer-se num sistema igrejeiro. Então eu não queria chamar o Espiritismo de religião para não pensarem que nós estávamos fundando uma nova religião. Mas sou obrigado a dizer que existe a Religião Espírita que é a consequência natural da Filosofia Espírita. Por que? Porque se a ciência, a investigação do espírito cientificamente provou que o espírito existe, que o espírito é a nossa próprio personalidade, que nós somos espírito, que o nosso corpo é secundário, o importante é o nosso espírito. Se isto foi provado e se se provou que a gente morre e o espírito continua a viver, e que o espírito é imortal, o espírito não morre, e que o espírito está ligado a um processo de evolução que o leva naturalmente a Deus, porque ele já traz em si o sentimento de Deus. É aquilo que Descartes dizia, volto eu a Descartes né? É aquilo que Descartes dizia, a ideia de Deus está no homem como a marca do obreiro na sua obra. Isso é que faz uma obra colimar sua marca. Assim Deus fez o homem e pôs a marca dele, a ideia de Deus no homem. A ideia de Deus é inata no homem, tão bem inata que em todos os tempos todos os povos do mundo tiveram sempre esse sentimento da existência de Deus.

O ateísmo e o materialismo são flores de estufa das grandes civilizações. Quando a civilização se desenvolve, atinge um apogeu, o homem se empolga com as conquistas da civilização, ele vê que muitas coisas das religiões estavam erradas, que a ciência tem que explicar de novo, então ele quer seguir esse caminho novo. E ele se convence de que ele já está com a verdade. O homem é muito orgulhoso, nós todos somos, muito vaidosos, muito orgulhosos. Por que que nós somos orgulhosos? Porque nós somos as únicas criaturas na terra que dispõe de pensamento reflexivo, de pensamento criador. Todas as demais criaturas, todos os animas, todos os seres da terra não tem essa capacidade. Então nós ficamos muito orgulhosos da nossa capacidade de pensar, de analisar, de verificar as coisas, de aprofundar no conhecimento das coisas e nos enchemos de vaidade e acabamos achando que nós somos os tais, né. E por isso mesmo então os grandes cientistas e os grandes sábios terminavam sempre caindo num campo de materialismo, de não aceitar nada das religiões. Eles tiveram mesmo de negar as religiões e lutar com as religiões, porque as religiões não queriam o avanço da ciência. As religiões se opuseram ao avanço das ciências. A ciência para avançar precisou lutar contra as religiões. Então tudo isto incentivou o desenvolvimento também do ateísmo e do materialismo.

Mas na verdade este ateísmo e esse materialismo sempre está restrito a uma elite, a grande massa da população não cai neste estado. Por que? Porque essa grande massa não está embriagada, por assim dizer, pelos elementos da cultura em desenvolvimento. Ela está ainda apegada aos seus sentimentos próprios, profundos sentimentos que traz consigo, os sentimentos religiosos. Os sentimentos do homem são religiosos naturalmente. Então a ciência [ele fala religião por acidente] fica restrita sempre a uma elite cultural e mesmo nesta elite como sabemos nem todos são antirreligiosos, nem todos são ateus ou materialistas. Mesmo entre os cientistas, eu falei de Einstein por exemplo, Einstein era um homem que dizia que quando ele começava a pensar em Deus, e ele queria fazer uma equação matemática que representasse Deus na matemática, ele caía na cama com febre alta, porque ele não conseguia alcançar. Quer dizer, então ele era um homem que reverenciava Deus, conhecia os seus limites e sabia que Deus realmente é alguma coisa que nós não podemos alcançar com os nossos métodos científicos comuns.

Mas aí então saindo do Evangelho Segundo o Espiritismo com a religião espírita. É preciso lembrar também o seguinte, antes disso. Lembrar que a Religião Espírita nasce precisamente então desse aspecto. A ciência descobre e prova a existência do espírito. Provando a existência do espírito nós temos uma modificação na concepção do mundo, porque a demonstração que a ciência espírita dá da existência do espírito e da sua natureza, não concorda com aquilo que as religiões dizem a respeito. Então a Filosofia Espírita nasce com uma concepção diferente, uma concepção que nem está ligada às religiões nem à ciência. É uma concepção que nós podemos considerar como intermediária, como esta aqui. Uma concepção intermediária, de um lado está a ciência e de outro lada a religião nesse novo esquema. De um lado está a ciência e de outro lado a religião, aqui no meio está o Espiritismo. O Espiritismo que… muito da religião. Então nós temos aqui aquilo que se chama de processo dialético, dialético significa o diálogo, quer dizer quando duas pessoas discutem, estão dialogando, elas chegam sempre a uma conclusão, ou brigam né, ou brigam. Se elas não brigarem, se elas tiveram capacidade para realmente trocar ideias e chegar a uma conclusão, elas chegam sempre a uma conclusão que reúne as duas posição, os dois pensamentos. Eu penso uma coisa, ele pensa outra, nós discutimos, discutimos, discutimos e chegamos a um ponto comum, em que então apresentamos uma terceira solução. Essa terceira solução é a síntese, né. Então aqui nós temos a ciência de um lado, a religião do outro há um diálogo, um debate entre elas, a ciência diz uma coisa e a religião contradiz. Mas desse diálogo, que é o processo dialético, sai então a síntese que é o Espiritismo. Então o Espiritismo se apresenta no nosso mundo como uma síntese do desenvolvimento cultural do nosso tempo. É uma síntese de desenvolvimento cultural que vem do Renascimento até o mundo moderno e até o mundo contemporâneo. Então esta síntese é alguma coisa de novo no mundo, alguma coisa que representa um avanço no conhecimento humano. E justamente por isso a importância do Espiritismo no mundo atual.

Mas o Espiritismo chegando a esta concepção de síntese que ele nos apresenta, ele nos leva naturalmente da filosofia para a religião. Por que? Porque toda religião, toda religião que é uma visão geral do universo no sentido espiritual e material, não apenas material, toda religião vai, exige de nós uma série de normas de conduta, de comportamento para o homem na sua vida, naquilo que ele esteja de acordo com seus princípios. E a religião nasce precisamente deste momento em que a filosofia se transforma numa moral que vai determinar normas de conduta para o homem de acordo com a sua visão filosófica, e como esta moral se refere também a vida do espírito, se transforma numa religião. Então a Religião Espírita se apresenta como aquilo que Jesus falou a mulher samaritana, é a religião em espírito e verdade. E lembremos o seguinte. Quando Jesus falou isto a mulher samaritana ele acrescentou, ele falou dos verdadeiros adoradores de Deus. Então ele disse o seguinte: “tempo chegará em que os verdadeiros adoradores de Deus não irão mais adorá-lo no Monte Garadin”, que era o monte que tinha o templo dos samaritanos que eram dissidentes dos judeus, sem contatos com os judeus, né, uma dissidência. “Não irão mais ao Monte Garadin nem no Templo de Jerusalém, porque eles adorarão a Deus em Espírito e Verdade”. Quer dizer, não mais através do culto exterior, não mais através do culto realizado numa igreja com imagens, com todo o aparato de um culto, mas adorando em espírito e verdade. Por isso ele recomendava as pessoas a orarem no seu quarto, em silêncio, afastados de todos, sem demonstrações exteriores, porque não precisava aquela exteriorização dos cultos. Então a religião espírita se define como uma religião viva, religião em espírito e verdade segundo esta colocação evangélica do problema da religião.

Mas além do Evangelho Segundo o Espiritismo como nós falamos, vamos encontrar o livro O Céu e o Inferno. E este livro O Céu e o Inferno é um verdadeiro julgamento que Kardec faz das religiões, e particularmente das religiões cristãs. Por que? Porque ele analisa e estuda muito bem o problema de como surgiu o dogma do inferno, e ele faz uma comparação muito importante entre o inferno dos pagãos… [e o inferno das religiões].

(Em breve, publicaremos o complemento da palestra – aguarde. Para ser informado, deixe um comentário com o seu email. CASO DESEJE “OUVIR” O PROFESSOR hERCULANO PIRES “AO VIVO”, VÁ AO ENDEREÇO: http://www.fundacaoherculanopires.org.br/)

 

Herculano Pires e sua posição frente à temática da revisão do Espiritismo

Capa Cajazeiras 1A discussão em torno do aspecto progressista do Espiritismo permeia as preocupações contemporâneas com o futuro da doutrina e, obviamente, implica o pensamento e as práticas que se desenvolvem nos diversos espaços públicos do país, e além destes.

J. Herculano Pires é um nome forte entre os mais presentes ou preocupados com a questão, amparado por uma obra que, se não toca toda ela diretamente na importância desse progresso, sustenta-o à base de reflexões originais imbricadas profundamente no pensamento de Allan Kardec.

Pouco mais de trinta e dois anos após seu retorno àquela que chamamos vida espiritual, sua obra permanece como fonte de consulta e, em muitos momentos, como base para a análise e os estudos de muitos dos que se lançam nesta tarefa de pensar o Espiritismo enquanto doutrina evolutiva.

Com base nisso, torna-se relevante considerar o lançamento recente do livro “Revisão ou reafirmação do Espiritismo?”, assinado por Herculano Pires sob a responsabilidade mediúnica do médico cearense Francisco Cajazeiras, este também escritor e palestrante reconhecido.

A obra ganhou o prefácio entusiástico de Heloisa Pires, professora e filha de Herculano Pires, cujo título – “Mais vivo do que nunca…” – confirma a plena aceitação da obra mediúnica assinada pelo pai, aceitação essa a estender-se aos demais membros da família.

O livro suscita reflexões inúmeras, seja enquanto produto mediúnico, a ser analisado neste aspecto como qualquer outra obra de mesma origem, seja por conta do pensamento sustentado e, até mesmo, dos princípios esposados e da tese que defende com ênfase.

A questão diz respeito de algum modo ao movimento espírita como um todo, mas toca direta e particularmente à parcela daqueles que constituem a Confederação Espírita Panamericana (Cepa) e tem no espaço público oferecido pelo SBPE uma oportunidade de debate do tema, tomando por base as ideias contidas na obra “Revisão ou Reafirmação do Espiritismo?”

É o que este trabalho pretende oferecer.

O pensador e a obra

Herculano Pires viveu entre 1914 e 1979, quando desencarnou em São Paulo. O seu tempo no corpo físico coincidiu com a duração da vida de Allan Kardec: 65 anos incompletos. O prestígio também foi considerável ou exponencial. Sua condição intelectual privilegiada conduziu-o a debruçar-se sobre as diversas áreas do conhecimento espírita e a refletir sobre a importância da contribuição doutrinária para o progresso da humanidade.

Herculano foi poeta, jornalista e escritor, filósofo e educador, conferencista e dirigente. Sua época ficou marcada por diferentes conflitos de ordem doutrinária, seja no campo da comunicação social espírita, seja no interior do próprio movimento espírita, e teve nele um protagonista indiscutível em grande parte desses conflitos.

Por quase todo o século XX, o espiritismo esteve às voltas com o dilema que ficou conhecido como fidelidade doutrinária. Foi esta a resultante de um constante pensar acerca dos princípios espíritas e de suas consequências, aplicabilidade e das práticas nos espaços públicos ocupados pelos centros espíritas.

Concentrada no continente sul-americano, mas também presente com razoável força em nações da América Central e do Norte, a questão da fidelidade doutrinária apresentou características singulares em cada uma destas nações, como já havia ocorrido na França por ocasião dos trabalhos desenvolvidos por Allan Kardec no século XIX.

No México, na Venezuela, na Argentina e no Brasil, obras de escritores vivos e de autores do além despertaram adeptos e contraditores. São exemplos disso, entre inúmeros outros, livros como “A vida de Jesus ditada por ele mesmo”, o laicismo, a tese do espiritismo cristão e da autoridade mediúnica, a religião espírita, a pureza doutrinária, os passes padronizados, como também a tese do corpo fluídico de Jesus.

Estas questões todas perpassam o trabalho intelectual de Herculano Pires e podem ser localizadas em sua extensa bibliografia de mais de oitenta livros.

O conflito ultrapassa as fronteiras terrestres

Com o livro “Revisão ou reafirmação do Espiritismo”, Herculano Pires faz o caminho de volta ao ambiente terreno e recoloca-se nos mesmos campos antigos de atuação. O livro tem a assinatura mediúnica do médico e professor cearense, Francisco Cajazeiras, em edição do Instituto de Cultura Espírita do Ceará datada de setembro de 2009. Foram impressos dois mil exemplares no formato americano 14 x 21 cm.

Até então, não havia registro das manifestações mediúnicas do conhecido espírito nesta mesma linha de atuação crítica. Foram poucas as suas mensagens e boa parte delas com a autoria contestada por estudiosos e familiares de Herculano. Por exemplo, Herculano por Carlos Baccelli e por Dora Incontri não é visto com bons olhos.

A questão colocada no título do livro – revisão ou reafirmação do espiritismo? – vai permear todas as dezenove mensagens que compõem o corpo principal da obra, tendo como destino ou alvo – e aqui não parece haver dúvida alguma – o movimento que propõe abertamente um processo permanente de atualização do espiritismo, conduzido pela Confederação Espírita Panamericana (Cepa) e que tem na “turma de Santos” um dos seus mais afinados segmentos.

O leitor poderá perguntar, antes da leitura do livro ou mesmo ao final dela: terá sido Herculano Pires-espírito o autor? A dúvida faz sentido diante do inusitado que a mediunidade normalmente representa, mas também se coloca por conta do compromisso do estudioso com a verdade. Em assuntos dessa natureza, buscar a veracidade da fonte torna-se necessário.

Aqui como alhures, a questão da autenticidade da autoria encontra suas dificuldades. O médium de Herculano-espírito tem suficiente bagagem intelectual para tecer por si próprio uma obra do gênero, o que não significa que o tenha feito. Trata-se de uma hipótese possível, entre diversas outras.

Em seu prefácio para o livro, a filha de Herculano, Heloisa Pires, afirma ter desfeito essa dúvida com a análise da linguagem do autor. É preciso lembrar que a família de Herculano, a viúva d. Virgínia à frente enquanto esteve viva, não aceitou a maioria das mensagens psicografadas atribuídas ao espírito dele, algumas delas vindas, inclusive, por médiuns bastante ligados ao pensamento de Herculano. Já agora, pouco antes de falecer, a viúva foi simpática às mensagens que lhe foram mostradas pelo próprio médium. O livro apareceria apenas mais tarde.

Observemos Heloisa no referido prefácio. Em primeiro lugar, faz o elogio do médium: “A credibilidade, o raciocínio, a personalidade de Francisco Cajazeiras bastariam para que Herculano fosse reconhecido nas mensagens que ele recebeu”. A seguir, refere-se ao aspecto que lhe parece fundamental, a linguagem. Diz ela: “Mas temos mais: o conteúdo, o modo de escrever, a análise da linguagem provam que o querido conseguiu provar que a personalidade conhecida entre nós por José Herculano Pires está mais viva do que nunca […]”.

Antes de prosseguir, convém refletir sobre esses aspectos citados por Heloisa. Evidentemente, há certo exagero ao atribuir à personalidade do médium ou à sua credibilidade a garantia definitiva para o reconhecimento da autoria das mensagens. Esse exagero fica por conta da satisfação indiscutível que tomou conta de Heloisa ao ler as mensagens assinadas por Herculano, tendo como suporte mediúnico alguém de notória estatura moral e intelectual, reconhecido não precisamente por contribuições mediúnicas, mas especialmente por livros de sua própria lavra.

Aquele que já era objeto de admiração era, agora, responsável por conteúdos que faziam reviver o pai admirável em sua nova condição, trazendo-o de volta com riqueza de detalhes e com semelhante condição apresentada quando ainda vivia no corpo físico.

È preciso levar em conta, também, a postura pública altamente crítica de Heloisa ao pensamento da Cepa e da turma de Santos, nos diversos episódios em que se envolveu, seja para defender o ângulo da religião espírita e condenar os seus negadores, seja até mesmo para se antepor à homenagem proposta pela Cepa ao seu pai, Herculano Pires, quando da realização em São Paulo da Conferência Espírita Panamericana, em 2002.

Quanto ao segundo aspecto, o da linguagem, trata-se, sem dúvida, de ponto importante a ser devidamente considerado. No prefácio, Heloisa se satisfaz em citar alguns pequenos trechos do livro, o último dos quais versando sobre a defesa que Herculano-espírito faz da religião espírita, ao final do qual ela diz: “Não é mais do que uma identidade? Não é a prova indiscutível da presença de Herculano entre nós?”

Evidentemente, questões de linguagem solicitam outros estudos mais. O texto piresniano possui estilo próprio em cada gênero por ele utilizado, de modo que uma análise aí se torna perfeitamente factível, senão para uma conclusão definitiva quanto à sua autenticidade do livro em análise, pelo menos para uma discussão sustentável.

De igual maneira, aspectos como o conteúdo e o estilo precisam ser detidamente estudados.

O médium e sua obra

A publicação do “Revisão” data de 2009 e nos comentários do médium que sucede ao prefácio de Heloisa Pires, Cajazeiras remete seu olhar para vinte anos antes e esclarece que, então, foi “intermediário de página intitulada “Limites Doutrinários” e, ao final da mesma, o autor espiritual quis assinar com o nome de J. Herculano Pires […]”. Não se julgou – afirma – à altura daquele nome, recusando-se a grafá-lo. Explica, pois, ter o espírito indagado pela razão disso, ao que respondeu: “O senhor ainda me pergunta por quê?” O espírito riu e disse: “Escreva, então, Irmão Saulo ou apenas Saulo”.

Não se fica sabendo, neste momento, se Cajazeiras atendeu ao pedido do espírito. Damos uma rápida olhada, porém, no livro “Conselhos mediúnicos” e ficamos sabendo que Cajazeiras resolveu que o espírito assinaria Irmão Saulo.

Cerca de dez anos depois, estando Cajazeiras em São Paulo aceitou convite de d. Virgínia, viúva de Herculano e foi ter com ela em sua residência, indo na companhia de sua esposa. Lá, depois de mostrar uma página por ele psicografada, sem declinar o nome do autor espiritual, ouviu de d. Virgínia a pergunta: “É do Herculano?”, ao que respondeu afirmativamente.

Seguindo suas próprias informações, toma-se conhecimento de que no segundo semestre de 2002, Cajazeiras e outros companheiros do Instituto de Cultura Espírita do Ceará discutiam sobre o “mais recente surto de tentativa de atualização do Espiritismo, notadamente a partir daqueles que articulam a fundamentação de um Espiritismo laico, não religioso e não cristão”.

Em outubro daquele mesmo ano, Herculano assinou página psicografada por Cajazeiras abordando o tema da atualização do Espiritismo e, desde então, o assunto ficou na pauta das relações entre o espírito e o médium. Mais tarde, ambos acertaram um encontro semanal em dia e horário fixos – às quintas-feiras, às 19:30 horas[i] – com a finalidade de prosseguir o tema. Havia, segundo o médium, um planejamento de Herculano para a escritura do livro, com plena aceitação dos seus pares espirituais. A Cajazeiras caberia a decisão de aceitar ou não a incumbência, dadas “as repercussões que se seguiriam”, como assinala.

Por fim, um último registro. As comunicações utilizaram a via psicofônica, foram gravadas em fita cassete e anotadas pela esposa de Cajazeiras.

Herculano, corpo e espírito

O conhecido espírito reaparece em corpo da mesma natureza, mas agora com outra constituição, fora do campo de visão dos simples mortais. Inicialmente, apresenta mensagens esporádicas que, por opção do médium, serão assinadas como Irmão Saulo e reunidas às de outros espíritos no livro “Conselhos Mediúnicos”[ii]. São ao todo sete mensagens. Depois volta à cena quando Cajazeiras e seus companheiros se mostram altamente preocupados com notícias a falar da atualização do Espiritismo. Neste contexto, vai produzir vinte e quatro páginas num período que começa em 5 de outubro de 2002 e termina em 6 de junho de 2009, com duração, portanto, de quase sete anos. Um tempo estranhamente longo para um assunto aparentemente urgente.

A sequência das mensagens no livro, como se pode observar no quadro cronologia das mensagens, não obedece à ordem de sua recepção, tendo sido provavelmente determinada pelo médium ou por aquele que assumiu a incumbência de organizar a obra para publicação. Porém, nenhuma explicação para isso é dada, o que sugere que o autor espiritual não elaborou previamente a estrutura do livro e não participou de sua organização final. Limitou-se apenas a ditar as mensagens sem uma ordenação prévia para publicação. O mesmo se aplica à escolha do título do livro e à forma como este seria assinado: J. Herculano Pires, diferentemente do que ocorreu com as primeiras mensagens.

A página tomada como prefácio do autor, de título “Palavras iniciais”, está datada de 23 de outubro de 2008. A que aparece na sequência – “Por amor ao espiritismo” – data de quatro anos antes: 7 de agosto de 2004. A que encerra o assunto – “Considerações finais” – data de 8 de janeiro de 2009, sendo que é sucedida por outras duas: “150 anos de esperança e luz”, de 10 de fevereiro de 2007, e “O eterno tema do amor”, de 23 de fevereiro de 2008.

Ainda a respeito da página “Considerações finais”, apesar desse título ela não é a última a ser escrita. Em termos de recepção, foi sucedida pela página “Chamado viril”, de 6 de junho de 2009, esta escrita apenas três meses antes da publicação do livro.

Percebe-se, portanto, que o livro não surge na mesa mediúnica na mesma sequência em que deve aparecer para o público. Sua organização deveu-se a critérios desconhecidos, o mesmo se aplicando à colocação, logo após o índice e antes do prefácio de Heloisa Pires, da página “Para falar de sonhos”, datada de 5 de novembro de 2005. Trata-se de uma poesia de Herculano-espírito, cujo tom destoa da obra e que, se se quiser encontrar uma razão para ela, poder-se-á recorrer a um sentido figurado, subjetivo, a levar em consideração seus dois últimos versos: “Pois, sem amor,/a razão enlouquece o coração!…”.

Por outro lado, a poesia é de qualidade duvidosa. Dentre os gêneros utilizados por Herculano-homem, o poético foi o que menos louros lhe trouxe. Este Herculano-espírito apresenta uma poesia com visíveis problemas métricos, rimas pobres e ritmo inconstante. Talvez seja por isso que Heloisa, ao comentá-la, tenha dito com certo acanhamento: “Para completar a alegria, Herculano ainda escreve uma poesia, não com a força da “África”, mas com o amor das poesias dedicadas aos filhos e à Virgínia, sua querida esposa”.[iii]

Registre-se, ainda, a título de nota, que as duas mensagens que fecham o livro, intituladas “150 anos de esperança e luz” e “O eterno tema do amor” poderiam perfeitamente ter sido preservadas para outra ocasião, uma vez que tratam de assuntos fora do
tema central do livro.

O tom, o foco, as intenções

Cajazeiras, o médium, deixou clara a razão do livro: as discussões em torno da revisão do Espiritismo. O assunto é antigo, foi objeto de inúmeras iniciativas, ganhou destaque ao tempo de Herculano Pires, como é exemplo o episódio da tradução do “Evangelho segundo o Espiritismo” na primeira metade da década de 1970, que aquele agora espírito combateu com veemência inaudita, conseguindo sepultar a infeliz edição da Federação Espírita do Estado de São Paulo, com tradução assinada por Paulo Alves Godoy. Não conseguiu, porém, evitar a tradução desastrada de Roque Jacintho para o mesmo livro kardeciano, uma vez que ao ser lançada Herculano já estava fora do campo de luta terrena.

Outros episódios do mesmo tema se multiplicaram, às vezes provocados por Herculano, às vezes envolvendo outros agentes. O corpo bioplásmico de Hernanes Guimarães Andrade recebeu de Herculano severas críticas, mas, ao mesmo tempo em que condenava esse tipo de iniciativa no campo científico, Herculano atacava outros flancos, sem nenhum temor, como ocorreu com o episódio dos ovóides de André Luiz, via Chico Xavier.

Qualquer tentativa de interferir nos textos originais de Kardec encontrava em Herculano uma sentinela atenta. Seu lema – quem não é capaz de enfrentar a verdade conspurcada pela mentira não é digno da verdade – ele o levava a sério, conquistando a admiração de uns e o desprezo de outros.

O tema da atualização do Espiritismo incomodava a muitos daqueles que, comparativamente, entendiam haver um descompasso entre as conquistas científicas, tecnológicas e culturais e parte do texto kardeciano, de mais de cento e cinquenta anos de vida, principalmente se considerados os retumbantes progressos realizados na área do conhecimento, de 1850 a esta parte.

Houve mesmo quem, de forma radical, propusesse uma reescritura geral das obras kardecianas, numa atualização que ultrapassava a área da linguagem e alcançava o conteúdo inteiro da doutrina, podendo atingir os seus princípios básicos, o que ninguém de bom senso admitiria. Não era novidade, também, que as críticas à linguagem atingiam as obras psicografadas por Chico Xavier, especialmente as assinadas por Emmanuel e André Luiz. O entendimento dos críticos era de que a linguagem destes espíritos estava descontextualizada e uma atualização aí se reverteria a favor da melhoria da divulgação doutrinária, o que não deixa de ser discutível sob diversos aspectos.

O grupo de Santos assumiu a bandeira da revisão do Espiritismo e a Confederação Espírita Panamericana deflagrou a campanha ao aprovar, em seu congresso de Porto Alegre, em 2000, a tese da atualização. A batalha, porém, encontra-se dividida em dois principais flancos: o da religião espírita, onde o conceito de cristianismo é condenado, e o da revisão, em que a atualização do conhecimento é reclamada.

Estamos, agora, novamente, diante de Herculano, somente que fora do mesmo campo, residindo em outro ambiente, ambiente este menos dominado por quem está do lado de cá e, por isso mesmo, com outros conflitos de difícil solução. Será ele mesmo, o Herculano de outrora, de retorno? A pergunta faz sentido, especialmente porque se tem notícia de que os espíritos passam por um processo de transformação diante do fenômeno da morte do corpo físico. A mente, em outro ambiente, reflete sob a influência dos seus elementos; a própria liberdade que o desprendimento dos limites do cérebro físico amplia predispõe o indivíduo a reflexões que antes não conseguia realizar. Quem, pois, é esse Herculano que retorna via mediunidade, sob o lápis ou a palavra de Francisco Cajazeiras, uma vez que o fenômeno aqui se divide entre psicografia e psicofonia, com predomínio desta, segundo o médium?

Para Heloisa Pires, a filha, a análise da linguagem reforça a convicção de ser ele, Herculano. Mas Heloisa, como se sabe, é filha, admiradora inconteste do pai e encontra-se numa situação de suspeição devido a esta ligação sentimental e emocional com o pai, mas também por conta das suas opiniões e posturas. Bacelli teria recebido mensagens de Herculano, mas não obteve aprovação da família deste, nem de Heloisa ou Rizzini, o biógrafo e amigo de Herculano.  Dora Incontri também não, apesar da admiração e respeito que tem pelo mestre e de ter frequentado as reuniões que Herculano dirigiu, por muitos anos, na garagem de sua residência, onde hoje está instalada a sede da fundação que leva o seu e o nome de sua esposa.

Heloisa está entusiasmada com Cajazeiras, apoiando a própria mãe, que pouco tempo antes de partir havia aprovado as mensagens do médico-médium. Vem ela de um recente momento de crítica severa à intenção da Cepa de promover uma homenagem a Herculano em seu evento 2002. Na ocasião, não aceitou a aprovação do nome de Herculano, uma vez que considera a Cepa protagonista da campanha que pretende retirar o Cristo do Espiritismo, segundo ficou convencionado, não importa se seja ou não verdade essa simbologia fixada como paradigma no ambiente espírita. Para ela, tratava-se de uma heresia, ou de um oportunismo, o uso do nome de Herculano em um ambiente que pretende ser laico, já que Herculano sempre defendeu o Espiritismo em seu tríplice aspecto – ciência, filosofia, religião – e a Cepa discorda deste último.

Heloisa é genérica ao apontar a linguagem das mensagens via Cajazeiras como elemento comprovador da autoria piresniana do texto. Expressa, acima de tudo, uma convicção, um sentimento, uma emoção. O estudo da linguagem tem suas complexidades, implica estilo, gêneros textuais, modos de expressão característicos e outros detalhes. Deixa, portanto, um campo aberto à especulação e estudo. É preciso, pois, debruçar sobre os textos de Cajazeiras e tentar entender essa presença e esse pensamento contundente, altamente crítico, endereçado, sem nenhuma dúvida, à Cepa e àqueles que dividem com ela as mesmas convicções.

Cajazeiras e seus companheiros, os quais formaram, segundo informa o médium, o grupo de contato semanal com Herculano-espírito, estão também situados nesta linha de pensamento contrário à pretendida atualização do Espiritismo. Trata-se de uma posição pouco explícita, se levarmos em consideração que não oferecem nenhum pensamento claro em relação ao tema. Depreende-se que eles se somam, apenas, aos que discordam da revisão doutrinária.

Terá sido isso um ambiente propício à manifestação do espírito, seja este o próprio Herculano, seja outro, assumindo a identidade deste? Ou terá havido um encontro de ideias, em que espírito e encarnados condividem o mesmo sentimento? Ou, ainda, terão os encarnados sofrido a influência do pensamento do espírito e tomado uma posição que favoreceu as relações mediúnicas?

Todas estas hipóteses se encontram colocadas com razoável possibilidade. Vamos, pois, tomar o caminho da resenha crítica, em cima dos textos mediúnicos e na sequência em que estão dispostos no livro, com a finalidade de tentar entender e clarificar o assunto.

Herculano por Cajazeiras

O texto em análise contém uma dose muito forte de virilidade, no sentido mesmo de Herculano. Esta virilidade não diz respeito ao gênero, não corresponde, como se poderia imaginar, ao conflito do masculino com o feminino, mas é o significado de um estado de espírito da individualidade, presente em sua argumentação. Não há como julgar seja essa força maior ou menor agora, mas a percepção a identifica com certa semelhança. Herculano-espírito se parece com Herculano-homem.

A semelhança não garante sejam a mesma individualidade, mas funciona como um indicativo nessa direção. A mesma linha de raciocínio vale para a temática central do livro, a da fidelidade a Kardec e a consequente defesa da pureza doutrinária, a qual se desdobra em subtemas, como se pode constatar na obra em análise.

Em suas “Palavras iniciais”, o autor espiritual entra direto no assunto da atualização, reconhecendo que Kardec previu a necessidade de o Espiritismo acompanhar o progresso. Diz ele, contudo: “Essas possíveis e necessárias reformulações, porém, somente se fariam – e se farão efetivamente – na forma de consenso entre os espíritas professos e somente se houver (e quando houver) o que reformar”.

O grifo para espíritas professos é do autor espiritual e dá margem a especulações sobre a intenção aí presente. O melhor conceito para espíritas professos diz respeito ao praticante ou atuante que aceita e propaga os princípios básicos da doutrina, consubstanciados na imortalidade da alma, na existência de Deus, na comunicabilidade dos espíritos, na lei de causa e efeito, na tese da reencarnação e no princípio da evolução da alma.

É, portanto, diferente de espíritas simpatizantes e outras aproximações, em que possa estar em litígio um ou mais desses princípios básicos, em decorrência de incompreensão de sua importância ou de sua função na engrenagem doutrinária. Neste caso, somente o professo reúne as condições mínimas para proceder qualquer mudança, seja por compreender a engrenagem, seja por compromisso de mantê-la em sua integridade, pois quaisquer alterações nos princípios básicos refletiria sistematicamente no funcionamento ou na lógica geral da doutrina.

Considere-se, ainda, que colocada a questão no plural – espíritas professos – aparece a ideia de coletivo, de interação comunicativa, de dialogismo. Ninguém fará sozinho mudança alguma; qualquer decisão aí deverá ser tomada coletivamente. A composição de um possível colegiado, contudo, é nebulosa: será a partir de um congresso, de uma convocação pública, haverá algum tipo de exclusividade institucional, número de integrantes definido, localidade, enfim?

A par disso, existem outros conflitos que o termo espíritas professos não elimina, como, por exemplo, a divisão já estabelecida entre espíritas cristãos e espíritas laicos, aonde a questão da religião assume posição de destaque. Serão, portanto, os laicos considerados espíritas professos em meio a uma maioria dominante de espíritas cristãos? Afora a aceitabilidade dos princípios básicos, que outros critérios serão utilizados para a definição dos espíritas professos?

A citação dá margem ainda a outras considerações quando assevera que as mudanças serão feitas “somente se houver (e quando houver) o que reformar”. O tempo da reforma surge, pois, como uma incógnita e arrasta consigo uma questão de conteúdo: mexer no quê? Para os espíritas laicos o tempo da reforma já chegou, mas para os espíritas cristãos ele está distante, uma vez que estes admitem que qualquer reforma só poderá ser levada a efeito por aqueles que, segundo o entendimento que expressam, fizeram a doutrina: os espíritos. Como estes não se manifestaram ainda a este respeito, depreende-se que o tempo não chegou.

Como num hipertexto, o assunto não se esgota jamais. Ao admitir que apenas os espíritos poderão promover qualquer alteração na doutrina, os espíritas cristãos não apenas expressam o pensamento de que não há encarnados capacitados ou autorizados a essa empreitada; ao mesmo tempo em que o fazem desprezam o fato de que se foram os espíritos que apresentaram a doutrina, coube aos homens revesti-la com sua linguagem, dando-lhe a devida identidade, e nesta ação Kardec tornou-se o comandante.

Herculano-espírito, ainda nas “Palavras iniciais”, afirma haver “emendas imediatas e imprescindíveis”, ou seja, aquelas que deveriam se antecipar à preocupação com a atualização doutrinária. Estas dizem respeito ao caminho tomado pelo movimento espírita, da introdução de “crendices e práticas estranhas ao Espiritismo” nas atividades dos centros espíritas. Seriam elas os “rituais, simbologias e mitos híbridos” presentes na cultura da “religiosidade salvacionista”, ao lado de “práticas pseudocientíficas”.

O autor espiritual arrola e condena aí os defensores de concepções científicas baseadas em “paradigmas organicistas, mecanicistas e reducionistas”, negadores da essência “não-material da consciência humana”, bem como aqueles que também negam ao “Espiritismo o seu status de Terceira Revelação e, mais do que isso, as suas relações genésicas e gnosiológicas com o Cristianismo”. Chama, também, a atenção dos que condenam Kardec por ter se submetido às influências socioculturais, “sem se aperceberem que eles mesmos é que se encontram tomados pelo narcisismo “intelectualóide” e materialista de sua inserção cultural”.

Tal posição não apenas elimina qualquer proposta de atualização do conhecimento espírita por parte dos encarnados como, também, a remete para um tempo que se desfaz no espaço.

Curiosamente, os espíritas se encontram diante de uma dupla realidade: uma primeira, em que a doutrina defende o progresso mas se apresenta fechada a ele por não saber como incorporá-lo, e uma segunda, em que o conhecimento está sendo constantemente atualizado, independentemente de haver ou não abertura no movimento doutrinário para isso. A diferença aqui é que as novas conquistas no campo do conhecimento permanecem à margem do corpo doutrinário, justamente por conta da ausência de estudiosos conscientes das realidades espirituais para costurarem objetivamente o conhecimento doutrinário com os novos saberes. E isto, sem dúvida, envelhece a doutrina.

Resumindo, a página que introduz o pensamento de Herculano-espírito no livro “Revisão ou reafirmação do Espiritismo?” reproduz o tom natural ao polemista do passado, retoma seus pontos de vista – defesa da religião espírita, combate aos reformadores afoitos, respeito incondicional a Kardec, crítica ao religiosismo de sacristia e consciência de uma tradição de revelação sagrada em que o Espiritismo constitui a última parte. Tudo isso permeado por uma linguagem forte, viril, típica de Herculano-homem. A defesa da religião e o combate ao religiosismo não constituem ambiguidade, apenas configuram o modo de ver do autor. Religião, para ele, se expressa pela compreensão das relações naturais entre o finito e o infinito, homem e Deus, relações estas que o Espiritismo aplainou, retirando delas todo o séquito de adereços, rituais, comportamentos mecânicos e estereotipados, racionalizando-o sem, contudo, encobrir o sentimento ou impedir a sua manifestação.

Essa constatação, porém, não responde às dúvidas iniciais sobre a identidade do autor espiritual. Aquelas permanecem, desafiadoras, porque não estão descartadas as condições intelectuais que o médium  ostenta nem a possibilidade de intromissão de inteligências estranhas no processo mediúnico.

Passo direto pela página intitulada “Por amor ao Espiritismo”, que sucede à “Palavras iniciais”, por duas razões: não consigo compreendê-la, considero-a estranha e, a princípio, contraditória. Segundo, não sei por que está ela ali colocada, fora do corpo do livro formalizado pelos capítulos.

De “Adversários da luz” até “Considerações finais”, um longo percurso

Estamos agora diante dos dezenove capítulos que constituem o corpo denso do livro. A palavra vigorosa deixa entrever a imagem de uma guerra. De um lado os defensores e de outro os adversários da luz, que “desejam ingloriamente desacreditar a Doutrina Consoladora”, segundo Herculano-espírito. Há, portanto, um conjunto de inteligências invisíveis a lutarem contra o avanço do conhecimento espiritual, conjunto esse forte o bastante para influenciar as inteligências visíveis, os homens, enganando-os e movendo-os feito marionetes, na direção de seus desideratos. Forma-se, portanto, um quadro de seres inteligentes mas ingênuos, bem intencionados mas inconscientes de sua própria condição. Em lugar de estarem, de fato, contribuindo para o progresso doutrinário, como imaginam, estão servindo às forças maliciosas que os controlam. Desejam enriquecer a doutrina, mas só fazem confundi-la ou desacreditá-la.

Herculano-espírito entende que “esses que ora se arvoram de intelectuais, que assumem a postura de reformadores, mal percebem que são regidos por organizações inteligentes que objetivam promover desvios lamentáveis no movimento espírita e ferir gravemente as naturais relações gnosiológicas da Doutrina Espírita”[iv].

Segundo o autor espiritual, “…a primeira ação adversa, a sórdida ação das trevas, foi confundir o exercício da caridade e o aspecto religioso da Doutrina, criando um religiosismo, igrejificando  o comportamento e a práxis espírita, transformando os Centros Espíritas em templos religiosos, no seu sentido mais restritivo…”.[v]

Mas, para Herculano-espírito, os inimigos mais perigosos são os “vorazes lobos internos da intemperança e da sensualidade, da indisciplina e da preguiça mental”. São estes que dão abertura suficiente para que aquele conjunto de inimigos invisíveis os controlem mentalmente, numa espécie de subjugação mansa, dócil.

A presença desse conflito em que estamos inseridos e não vemos a porta de saída é curiosa. De um lado o centro espírita igrejificado, rotulado, ritualizado, merecendo ação enérgica na direção de uma mudança completa, e de outro a manutenção da condição religiosa como meio de manifestação positiva do sentimento de religiosidade natural ao indivíduo, como expressão de uma consciência que suplanta a herança genética, presente na inteligência que habita o corpo físico antes mesmo de esta vir ocupar o corpo físico.

O autor espiritual expõe a sua percepção da realidade cotidiana do movimento espírita: “E eis que, após costurar-se um movimento espírita de feição igrejeira, são os mesmos grupos, mancomunados no sentido de fazê-lo perder-se, desacelerando a difusão da Verdade acesa pelos Espíritos Reveladores, que se aproveitam dessa falha conjuntural e intentam negar o lado religioso da Doutrina Espírita, solapando-lhe a cidadania cristã. E isso, não por convicção, mas como estratégia perversa para deixar o movimento espírita capenga, vazio de uma das suas sustentações do tripé científico-filosófico-religioso, deixando-o apenas com duas das pernas, certos de que, assim, lograrão levá-lo à ruína”.[vi]

De um lado, os espíritas cristãos são vistos como causadores de desvios doutrinários, artífices de um espiritismo de igreja, enquanto que, de outro lado, os que os combatem, os laicos, ao negar o aspecto religioso deixam capenga a doutrina e se colocam – tal qual os espíritas cristãos – a serviço dos adversários invisíveis. Uma terceira força aparece nesse meio, constituindo uma espécie de triângulo fatal: “Até mesmo algumas entidades espirituais desencarnadas organizam-se inocentemente no plano espiritual e se imaginam convictas de seus atos, despercebidas de que, por sua vez, são comandadas por aquelas instituições sombrias”.[vii]

Está-se numa encruzilhada terrível, num imenso túnel sem luz e ninguém sabe de onde virá a força esmagadora que passará sobre todos.

Apesar disso, uma inevitável contingência se coloca: o progresso permanece em sua dinâmica, o espiritismo é progressista e a vida clama pelo conhecimento.

Note-se, o autor espiritual não desconsidera essa necessidade de acompanhar o progresso, mas deixa extremamente vago o seu tempo de realização, como se observa aqui: “Decerto, no tempo adequado, quando a ciência expandir seus horizontes, adentrando o mundo espiritual, descobrindo definitivamente o perispírito, venha ampliar os seus postulados, sem desfigurar-lhe a base”.[viii]

Reconheça-se, o texto neste trecho é obscuro.

O ponto principal, no entanto, é este: “o Espiritismo é obra concluída (pelo menos para a Humanidade atual) e nele não se encontra motivos para interpretações dessa ou daquela espécie, no que respeita aos seus princípios básicos gerais. Kardec esteve sempre atento à problemática da ambiguidade, primando invariavelmente pela clareza das ideias e de linguagem”.[ix]

O destaque está estabelecido, já agora com certa definição, ou seja, os princípios básicos gerais não são matéria de interpretações conflitantes entre si. Essa virtude decorre do fato de que Kardec, “com o seu reconhecido bom senso aplicado ao futuro, imprimiu-lhe movimento indispensável à preservação da mensagem espírita, evitando-se que venha a caducar pela estagnação”.[x]

Uma vez que não haja dúvida quanto ao que sejam os “princípios básicos gerais” e, ainda, que haja por eles total respeito, a própria doutrina em si estará preservada. Nesta linha de pensamento do autor espiritual, é admissível, ou mesmo necessário, entender que certos aspectos, por muitos não vistos como integrantes dos princípios gerais, sejam aí colocados e como tais aceitos. Um exemplo? A compreensão da doutrina espírita como Terceira Revelação, decorrente da promessa consoladora de Jesus, e o Cristo na posição de artífice da moral espírita. Sob este aspecto, ter-se-á que retomar o conceito de cristianismo, não mais como expressão da fé católica, mas da mensagem do Cristo em sua dimensão original.

Os capítulos V a IX do livro em foco argumentam nesta direção, reproduzindo os pensamentos de há muito conhecidos e presentes na obra de Herculano-homem. Tratam de Deus, teologia, religião, religiosidade, evangelho, Kardec e doutrina. Reafirmam a visão do autor sem nada acrescentar ou alterar, reforçando os aspectos acima relacionados.

Colocada dessa maneira, a questão implica uma expectativa de mudança nos argumentos e na visão daqueles que não consideram válido o vértice da religião espírita, preferindo tratá-lo como ângulo das consequências morais. Ou seja, mudança na percepção do espiritismo por parte dos laicos. Herculano, homem ou espírito, não importa, praticamente o exige, oferecendo em troca sua interpretação de religião que atende e valoriza a religiosidade e ao mesmo tempo combate toda forma institucional, ritualística, sacramental de manifestação do sentimento religioso.

“Há uma profunda dessemelhança” – dirá ele – “e mesmo um indisfarçável antagonismo ideológico entre o Cristianismo engendrado pelos concílios – formatado pelo poder temporal – e o Cristianismo do Mestre de Nazaré”, em reforço ao seu argumento fechado em torno da noção de revelação espírita, da qual não abre mão justificando-se como compromisso com a verdade, verdade que se reforça com a visão epistemológica, assegura ele.

Evidentemente, o fosso aqui se mostra em toda a sua amplitude. Os espíritas laicos não reconhecem o aspecto religioso e sua argumentação assenta-se no fato, para eles, claramente comprovável, de que Kardec também não a aceitou e na significação assumida pela expressão “cristianismo”, que não mais remete ao seu sentido semântico, pois sucumbiu ao peso e à força do catolicismo romano, sendo, pois, expressão deste e não mais do ensinamento de Jesus.

Herculano-espírito também parece não crer na mudança dos laicos em sua percepção do espiritismo e talvez nem mesmo a exija de fato. Tanto é verdade que ele prossegue a apontar a inexistência de razões factuais para atualização do espiritismo: “Pergunto, no entanto: o que nesse meio tempo clama por reforma doutrinária? Que mudanças se impõem, dentro dos critérios racionais preestabelecidos por Kardec, ao seu corpo doutrinário?”.[xi]

Corpo doutrinário – o que é isso? Refere-se ao conteúdo integral e textual da obra kardeciana ou diz respeito apenas aos seus postulados, aí considerados os “princípios básicos gerais” e toda a matéria de sua sustentação filosófica? Se considerarmos que o autor espiritual pensa no conteúdo integral e textual, o sistema se fecha – nada pode ser alterado. Se se refere apenas aos princípios básicos e sua sustentação filosófica, o sistema estará aberto, logicamente dinâmico e ao mesmo tempo autoprotegido

Na segunda hipótese, todo conteúdo representado pelo “corpo doutrinário” restará preservado, ao lado do respeito total e inalienável dos direitos do autor, o que significa não introduzir e não produzir qualquer alteração de sentido ou formal à obra que se distribui nos diversos volumes publicados.

O que será passível de reparo é o conteúdo periférico, o conhecimento marginal, as informações adicionadas que o tempo, o progresso e as descobertas científicas cuidaram de modificar.

Herculano-espírito reconhece o progresso do conhecimento, mas garante que esse avanço não afetou qualquer princípio doutrinário. Nestes termos: “O desenvolvimento científico e tecnológico, nesse espaço de tempo – sabemos todos – foi extasiante. A velocidade da expansão do conhecimento foi e é vertiginosa. Mas, em que contradiz ou inviabiliza a base da doutrina espírita? Em nada! – respondo sem titubear. O que vemos é, a cada dia e a cada passo do progresso científico, em seus mais diversos aspectos, uma reafirmação e a confirmação do conteúdo da Doutrina. Nenhum postulado sofreu sequer um agravo superficial” (grifos do autor). O critério da universalidade do ensino dos espíritos, utilizado por Kardec, desperta em Herculano-espírito outro questionamento, sempre com vistas a argumentar junto aos interessados na reforma. Pergunta ele: “quem poderia, pois, nesse momento, cuidar daquela universalidade? Aliás, onde estaria a universalidade em nosso tempo? Seria possível reunir as mesmas condições, para reeditá-las em nossos dias?”.[xii]

Nessa linha, conclui: “a Doutrina em si não necessita, ainda, de revisão”.[xiii]

Mas, curiosamente, na sequência, Herculano-espírito abre-se para a possibilidade da reforma, inclusive, dos princípios básicos, como se pode observar no fecho do capítulo X: “O progresso científico e o estabelecimento da Doutrina dos Espíritos permitirão, no tempo devido, se efetivem os necessários e indispensáveis complementos, além de desenvolver os princípios na Codificação”.[xiv] Grifo nosso.

O problema, no entanto, é colocado em termos de tempo futuro, incerto, e – não se pode deixar de mencionar – está, para ele, relacionada de certa maneira com a participação dos espíritos, a quem a doutrina pertence. Não está clara a forma como essa participação se dará, se de maneira direta, objetiva ou a partir de outros meios igualmente controláveis.

Parte da resposta a este ponto parece estar contida num longo parágrafo presente no capítulo XI. Trata-se de uma posição de alguma forma também surpreendente assumida pelo autor, porque, de um lado, tenta explicar não só ação dos espíritos nesse processo de atualização, como também ajunta no processo os próprios encarnados. O inusitado fica por conta de haver Herculano-espírito, até aqui, combatido os esforços de atualização promovidos ou desejados, sob o argumento da falta de credibilidade dos interessados na atualização.

Vejamo-lo[xv].

1) “A estratégia utilizada pelo movimento espírita do invisível, para a demonstração da contemporaneidade dos ensinamentos espíritas, tem sido a de conduzir estudos, análises o observações, em trabalho de construção de uma ponte entre as revelações científicas do mundo contemporâneo em transição e os ensinamentos fundamentais da Doutrina Espírita. Esse procedimento alcança a plêiade de espíritos desencarnados destacados para esta missão, que se comunicam ostensivamente pelo uso sério e saudável da mediunidade positiva, através de médiuns verdadeiramente espíritas;”

2) “como também a todos os espíritas despertos e conscientes para essa frente de serviço; homens e mulheres envolvidos e relacionados, em suas atividades e cogitações, com o  conhecimento científico e as revelações que naturalmente se fazem nessa área, em direção àquela iniciada e antecipada no século XIX, quando do advento do Espiritismo. Esta, sim, a destacável e mais premente tarefa do movimento doutrinário dos nossos dias, a requerer coragem e determinação para a sua execução”.

Como se observa, o autor espiritual fala de uma ponte em construção entre os conhecimentos contemporâneos e os doutrinários e esta se mostra como “a mais premente tarefa” para a atualidade da doutrina. Parece contraditório? Sim e não. Se considerarmos que este Herculano-espírito emprega na maior parte do livro um tom extremamente forte ao combater a pretensão de uma reforma no espiritismo para, logo após, em breves momentos, apoiar e mesmo destacar as ações nessa direção, então estamos diante de uma contradição. Mas se se considerar que fechar a doutrina ao progresso do conhecimento é contribuir para que ela se torne caduca em pouco tempo, além de ser, também, contraditório com ela mesma e com as esperanças kardecianas, então se pode pensar em outro tipo de preocupação por parte do autor. Qual seria ela? É o que não está claro.

A partir de certo momento, depois de haver combatido com veemência as iniciativas de atualização do espiritismo, o autor espiritual passa a considerar essa atualização necessária, chegando até a mencioná-la como em processo. O tom, então, fica ora mais brando, ora mais viril, num vai e vem que incomoda. É assim que, no capítulo XII, o autor espiritual retoma a questão da ponte ou diálogo entre a ciência e o espiritismo, destacando que os espíritos condutores do movimento espírita estimulam esse diálogo, mas, em seguida, apressa-se ele a fazer uma ressalva: “Não se deve, porém, entender com isso, que o Espiritismo deve caminhar na dependência de pesquisas científicas incipientes nem que aguarda o parecer dos cientistas para os seus postulados, mas que há uma abertura para a elucidação dos pontos de contato nesse continuum natural do espiritual com o material”.[xvi]

Outras contradições inquietantes

A próxima anotação a fazer diz respeito à linguagem de Herculano-espírito por Cajazeiras. Como já destacamos, a linguagem tem bastante semelhança com a utilizada por Herculano-homem, especialmente nas obras polêmicas, como, por exemplo, “O centro espírita” e “Na hora do testemunho”. Algumas diferenças podem ser, todavia, notadas: a espontaneidade, a naturalidade da escrita e a multiplicidade de ideias, que em Herculano-homem são marcas registradas, não se repetem em Herculano-espírito. Aqui, o texto aparece seco e árido, como se encontrasse filtros limitadores intransponíveis, de um lado, e um leito a ser percorrido, de outro. Assim, muitas ideias se tornam redundantes ou repetitivas.

No escritor, as palavras escorrem, soltas e saltitantes, numa atmosfera viril e brilhante ao mesmo tempo, enquanto que no mediúnico elas derrapam e às vezes estacionam. Há momentos em que a ideia parece querer se soltar, mas a sua forma simbólica recua, como que à espera do termo exato, que, contudo, não chega. Nessas ocasiões, a frase se completa da única maneira que pode, ou seja, com termos inusuais, estranhos ao escritor.

Vale lembrar, apenas como exemplo, dois trechos de Herculano-homem, que podem ser lidos em “O centro espírita”, onde não só a ideia encontra-se cristalina, como o estilo perfeitamente identificado.

Vejamo-los[xvii].

1) “O centro espírita não é templo nem laboratório – é, para usar a expressão espírita de Victor Hugo: point dóptique do movimento doutrinário, ou seja, o seu ponto visual de convergência”.

2) “Se os espíritas soubessem o que é o centro espírita, quais são realmente a sua função e significação, o Espiritismo seria hoje o mais importante movimento cultural e espiritual da Terra”.

A par destes detalhes lingüísticos, encontramos também em muitas outras idéias ocasião para novos estranhamentos. São aqueles momentos em que as idéias do espírito contrastam com as idéias do homem, ou, pelo menos, as idéias aceitáveis, dadas as características da personalidade conhecida.

Eis um exemplo. No texto a seguir, pode-se questionar se o Herculano que vimos e reencontramos na literatura pensa, de fato, contrariamente aos postulados alteritários. Diz ele no livro da Cajazeiras: “Por outro lado, cresce preocupantemente, a cada dia, um movimento que de maneira pérfida nega a importância e a necessidade de “espiritização” do mundo, escudando-se de forma sórdida na natural tolerância do Espiritismo para com outros pensares religiosos e o respeito à crença alheia; na reconhecida disposição de não se impor e na despreocupação de fazer adeptos; no entendimento de que a qualidade deve preponderar sobre a quantidade”.[xviii]

O espírito, aqui, parece antepor-se àquilo que o homem defenderia como premissa da moral kardeciana: o respeito à crença alheia. Da mesma forma, o espírito também condena o a qualidade do indivíduo enquanto adepto, trocando-a pela quantidade inexpressiva. Não se pode compreender isso, do mesmo modo que não se pode deixar de perceber que a crítica da alteridade, assim estabelecida, tende a estender-se em alguma medida ao próprio cotidiano espírita, promovendo o desrespeito e a intolerância para com as diferenças.

O homem que um dia afirmou não haver “mais lugar para fanatismos de qualquer espécie no mundo atual, iluminado pelas esperanças da Era Cósmica”[xix] poderia contradizer-se tanto e tão visivelmente depois de aportar ao novo mundo?

E o que pensar do homem que escreveu outrora que “a verdade maior – ou verdadeira – é a que nasce do contexto social, da usina das relações, onde o indivíduo se forma pelo contato com os outros”[xx], frente ao espírito que agora vem colocar em dúvida a antiga afirmação?

Ou então, como entender o que o espírito assevera agora, diante do homem que um dia afirmou, com convicção: “O processo civilizador do Cristianismo é espiritual e não material, porque o homem é espírito e não matéria. Seu objetivo não é a quantidade, mas a qualidade. Seu método não é massivo, mas coletivo, não opera me termos de massa, mas de coletividade”?[xxi]

Impossível acreditar no espírito sem condenar o homem… E vice-versa.

Outra idéia de Herculano-espírito que Herculano-homem teria dificuldade de validar encontra-se neste trecho: “[…] não há dúvida de que Allan Kardec faz-nos imensa falta e o seu retorno acontecerá no tempo apropriado, a depender, até certo ponto, das condições que os componentes do movimento espírita em experiência carnal oferecerem para o cumprimento da profecia de seu retorno ao palco da existência terrena, no sentido de complementar e expandir a obra que iniciou”.[xxii]

A estranheza aí fica por conta da própria condição profética do texto e do momento em que aparece, quando a atualidade do espiritismo está sendo discutida em meio, de um lado, à necessidade de acompanhar o progresso, e, de outro, à ausência de condições para tanto, apontadas pelo espírito. Situação ambígua essa, que se agrava com o tom profético, incomum ao homem Herculano, provocando desconfiança no leitor. Será que Herculano se incluiria, ele próprio, entre os “novidadeiros” que tanto combatia?

Pode-se ajuntar agora este outro trecho, tão distante do escritor, pela forma ingênua e pelos sentidos ambíguos que sugere produzir: “O “Pai Celestial” cuida que os habitantes desse mundo recebam todas as oportunidades para a resolução de sua problemática espiritual”.[xxiii] A qualidade e a riqueza do texto do homem cede aqui ao simplismo da fala mediúnica.

Reveja-se, ainda, esta passagem a suscitar desconfiança: “Até mesmo algumas entidades espirituais desencarnadas organizam-se inocentemente no plano espiritual e se imaginam convictas de seus atos, despercebidas de que, por sua vez, são comandadas por aquelas instituições sombrias”.[xxiv] O caos aqui está estabelecido, o mal utiliza o bem para produzir confusão e desvios e o bem, iludido, age em favor do mal, em flagrante contraste com o que o escritor diz em “O centro espírita”: “Um trabalho de amor ao próximo, feito com sinceridade e intenções elevadas, conta com a proteção dos Espíritos benevolentes e a própria defesa de suas boas intenções”.[xxv]

Conclusão e inconclusões

Deve-se considerar que o livro “Revisão ou reafirmação do Espiritismo?” reproduz as teses defendidas por Herculano Pires quando no corpo físico terreno, relacionadas à doutrina espírita. Assim como no passado, Herculano por Cajazeiras faz a defesa do espiritismo como Terceira Revelação, reafirma a sua condição de religião e suas ligações com o cristianismo, ao mesmo tempo em que retoma as antigas críticas aos atualizadores da doutrina.

A lógica de seus argumentos permanece a mesma, fundando-se nos laços que amarram as diversas partes da doutrina a partir da concepção kardeciana e se estendem para além do marco inicial do espiritismo, na visão do escritor.

A obra, porém, oscila constantemente entre argumentos lógicos e racionais e uma retórica de pura pressão psicológica, como se desejasse convencer o leitor pela razão e o medo ao mesmo tempo. Em consequência disso, o leitor também se vê oscilando entre a aceitação e a recusa do livro, entre interessado e desconfiado da autoria espiritual.

Não há como negar que a veracidade da fonte, para ser afirmada, pede estudos mais amplos. A semelhança da linguagem e das ideias entre o atual espírito e o antigo escritor é insuficiente para qualquer conclusão a este respeito. Da mesma forma, negar a autoria com base apenas nos conflitos e ambiguidades apontados, ainda que evidentes, parece precipitado.

Com isso, o problema retorna à sua origem: revisar ou reafirmar o espiritismo? Qual caminho tomar, que postura adotar frente os desafios do conhecimento e das exigências do tempo, dos compromissos doutrinários e da inserção do espiritismo na sociedade?

A questão pode ser colocada, também, em outros termos, ou seja, num campo não excludente, em que uma coisa não elimine a outra. Será possível pensar em reformar e reafirmar, ao mesmo tempo? Mas, então, sobre que bases iniciais? Que método escolher, quem envolver?

A interrogação está no ar…


NOTAS[i] Há aqui um equívoco, provavelmente produzido por falha de memória. Como se pode observar no quadro cronologia das mensagens, apenas uma parte destas foi recebida nas noites de 5ª feira.

[ii] Editora EME, Capivari, SP, 2002.

[iii] Página 16.

[iv] Página 47.

[v] Página 45.

[vi] Página 47.

[vii] Página 48.

[viii] Página 57.

[ix] Página 79.

[x] Página 80.

[xi] Página 80.

[xii] Página 102.

[xiii] Página 82.

[xiv] Página103.

[xv] Página 109

[xvi] Página 141.

[xvii] Apud Kardec é razão, p. 48/49.

[xviii] Página 33.

[xix] Apud Kardec é razão, p. 129.

[xx] Idem, p. 135.

[xxi] Idem, p. 143.

[xxii] Página 109.

[xxiii] Página 36.

[xxiv] Página 48

[xxv] Apud Kardec é Razão, p. 52.

 

Referências bibliográficas

CAJAZEIRAS, F. Conselhos mediúnicos. 2ª edição, Ed. EME, Capivari, SP, 2002
GARCIA, W. Kardec é razão. Ed. USE, São Paulo, SP, 1998.
PIRES, J.H. Revisão ou reafirmação do Espiritismo? Edições ICE, Fortaleza, CE, 2009.
RIZZINI, J. J. Herculano Pires, o apóstolo de Kardec. Ed. Paideia, São Paulo, SP, 2001.

Cronologia das mensagens
Título1
Data
Dia semana
Obs.
Para falar de sonhos
05/11/2005
Sábado
As mensagens e os dias da semana em que foram   recebidas:
2ª feira, 2;
4ª feira, 3;
5ª feira, 7;
sábado, 14;
s/ data, 1.
Ano de recepção das mensagens:
2002: 9
2003: 1
2004: 2
2005: 1
2007: 2
2008: 7
2009: 2
s/ data: 1
*Nota: mensagens recebidas, cada   uma, em dois dias diferentes.
Palavras iniciais
23/10/2008
4ª feira
Por amor ao Espiritismo
07/08/2004
Sábado
Adversários da luz
s/ data
Revelação espírita
05/10/2002
Sábado
Motrizes da caridade
12/10/2002
Sábado
Religião Espírita
19/10/2002
Sábado
Providência e saber teológico
26/10/2002
Sábado
Religião e religiosidade
31/10/2002 e 02/11/2002
5ª feira e sábado, respectivamente*
O Espiritismo ontem, hoje e amanhã
07/11/2002 e 09/11/2002
5ª feira e sábado, respectivamente*
Kardec e o Evangelho
14/11/2002
5ª feira
Significado da revelação espírita
20/11/2002
4ª feira
Reforma, mediunidade e universalidade
27/11/2002
4ª feira
Aprendendo com a história
21/04/2003
2ª feira
Ação espírita ante as necessidades humanas
06/09/2008
Sábado
Frutuosas figueiras
30/08/2008
Sábado
Remendos velhos em panos novos
23/10/2008
5ª feira
Livre-arbítrio, responsabilidade e educação
06/11/2008 e 20/11/2008
5ª feira
Portas para o amor
07/06/2004
2ª feira
Síntese e elo de ligação do conhecimento
04/12/2008
5ª feira
Chamado viril
06/06/2009
Sábado
O espírita no centro espírita
25/08/2007
Sábado
Considerações finais
08/01/2009
5ª feira
150 anos de esperança e luz
10/02/2007
Sábado
O eterno tema do amor
23/02/2008
Sábado
1 Ordem em que as mensagens aparecem no livro.