Meu Deus!

 

Atenção, eu não disse: Meu Deus.

Meu Deus é isso, exatamente isso que você pensa, por lo tanto, não preciso descrevê-lo, porque seria uma repetição daquilo que tantos e tantos falaram e vão falar ainda.

Aqui, meu Deus! é a expressão do meu espanto, daí ser necessário um sinal de exclamação. Um basta; mais do que um é desperdício e sem ele a comunicação alcança o limite da entropia.

Sabe o que me espanta. Sim, você sabe: o desconhecido. Ou tudo aquilo que meus sentidos, cada um de per si e todos juntos não alcançam, embora eu fique achando sempre que estou na soleira da porta de entrada de seus domínios.

Meu Deus! É o que digo imediatamente após perceber que ultrapassando a porta, ela se fecha atrás de mim e a chave é jogada no Sena. Junto, então, meus sentidos, como soldadinhos de chumbo, e olho para frente.

Sabe o que vejo. Sim, você sabe: um novo labirinto pelo qual devo seguir e descobrir, por mim, como se fosse capaz, o único caminho que levará à próxima porta e assim sucessivamente.

E porque não desisto também você sabe: me afeiçoei ao desconhecido de tal maneira que antes mesmo de alcançar a saída do labirinto em que estou, já fico pensando na próxima soleira e no que poderá vir depois que a próxima porta se fechar atrás de mim.

Do primeiro espanto não guardei data, mas a sensação de medo que gerou a fraqueza que me atirou no solo que me pareceu gélido e onde fiquei jogado até à exaustão.

Também porque então não me matei de vez você sabe: porque não tinha nas mãos o poder, essa chave ambicionada que se torna metal líquido toda vez que pensamos tê-la. Sempre que a temos, ela imediatamente escorre entre nossos dedos, deixando apenas o cheiro ruim de matéria queimada. E de tanto me matar, descobri que em mim também se realiza a recomposição da parte cortada, de maneira que no sofrimento de cada desistência descobri que deveria seguir adiante, em pé.

Recorde-se, pois você já sabe, que o primeiro espanto acabou gerando o gosto pelo novo, pelo desconhecido e, para verdadeiro espanto, despertou-me para apreciar o sabor dos labirintos que se sucedem, interminavelmente.

Embora você saiba, preciso dizer que houve uma metamorfose, lenta, é verdade, mas real nos labirintos. Dos primeiros, totalmente escuros que só permitiam seguir por apalpadelas, aos atuais, claros, iluminados, multicores, que me fizeram perceber que o mistério não precisa necessariamente da ausência de luz para ser mistério.

Ah você sabe que a luz era mistério até deixar de ser e depois retornar a ele. Pois essa é a razão do meu espanto, do meu prazer de dizer: Meu Deus! É sempre assim, você descobre e domina, depois perde o poder sobre o dominado para a seguir descobrir e dominar novamente, na sucessão mágica de descobertas.

O que eu não sei se você sabe é que o desafio dos labirintos novos não é mais encontrar a rota da saída, que esta deixou de ser importante, mas é descobrir o segredo do labirinto; este é a chave da rota, porque quando o alcança você se vê, imediatamente, na saída do labirinto e com disposição redobrada para repetir: Meu Deus! Pois sabe que haverá um novo à frente.

E penso que você também não sabe é que há qualquer coisa no ar me dizendo que o futuro dos labirintos é deixar de ser labirintos. Há lógica nisso, pois a cada novo labirinto a claridade vai se tornando maior e começo a perceber que as linhas tortuosas que o formam estão lentamente desaparecendo. Antes, elas eram uma espécie de muro, largo e alto, de modo a impedir a fuga e a visão. Agora, são muros ainda, mas pequeninos, baixos, parecidos com as faixas de trânsito das nossas estradas.

Você sabe porque percebeu que, embora os muros tenham como que caído e por isso não precisamos nos preocupar mais em descobrir a rota certa, pois ela está visível ao olho humano, ainda assim não pulamos as faixas, porque o desafio é… o segredo.

Para finalizar, embora saiba que você sabe, digo que a plena liberdade está nos labirintos do nosso cotidiano. Posso pular as faixas, encurtar caminhos, mas para que se isso não me permite descobrir o segredo nem me leva ao final do labirinto. Por lo tanto, não me permite alcançar o pleno prazer e só me impedirá de chegar à próxima soleira que tanto desejo.

Se há algo em mim a causar-me ansiedade e expectativa é uma quase necessidade intensa de expressar meus espantos e dizer: Meu Deus! E isso tenho certeza que você só sabe agora.

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