Um coração grande para uma razão imensa

O caro Arnaldo da EME, amigo de tantas décadas, que assina Rodrigues de Camargo, enviou-me em abril passado um exemplar do seu livro Mente saudável, vida serena, recém-publicado pela mesma editora que fundou e com garra especial dirige na cidade de Capivari, interior de São Paulo. Edição bem cuidada, com ilustrações expressivas e cores leves, em acordo fino com o sentido dos textos que reuniu, páginas de sua criação esparsas aqui e ali, agora num só volume.

Aí está. Mente saudável, vida serena nos trás um Arnaldo de hoje, depois das esfregas editoriais que todo gráfico há de ter para ser de fato um editor, e das subidas e descidas da vida que a estrada apresenta em suas surpreendentes nuances diárias; mas é, no fundo, o mesmo homem de mais de quatro décadas atrás, quando o conheci e desde então persegui e provoquei, vi e admirei. Dedicado às boas causas, persistente, aprendiz em regime continuado, de fala tranquila, editor mais por destino que escolha, mas desafiador no ramo livreiro pelo qual se empolgou: o livro espírita.

Quando leio as páginas deste seu Mente saudável, vida serena, confesso, (mais…)

Nova seção

A partir de hoje, 10 de junho de 2023, o leitor deste blog tem uma nova seção disponível. Trata-se da página Postagens esquecidas, que ficará permanente e poderá ser acessada pelo interessado, quando desejar. Já está disponível nela o primeiro texto, intitulado A (im)prensa. E o espiritismo?, escrito tempos atrás e esquecido entre os materiais a publicar. Para ler, clique aqui. A nova seção será abastecida sempre que um texto não publicado for descoberto e por aqui darei ciência de cada um deles ao distinto leitor. Boa leitura.

O cerne da questão dos sofrimentos futuros

Com o advento da concepção da autonomia moral e livre-arbítrio dos indivíduos, a questão das dores e provas futuras encontra uma nova noção, de acordo com o que se convencionou chamar justiça divina.

O pior das discussões sobre os fundamentos do espiritismo se dá quando nos afastamos do ponto central ou, tão prejudicial quanto, sequer alcançamos esse ponto, ou seja, permanecemos na periferia dos fatos, casos e acontecimentos justificadores. As discussões costumam, normalmente e para mal dos pecados, se desviarem do foco e alcançar um estágio tal de distanciamento que fica impossível um retorno. Em grande parte das vezes, o acirramento dos ânimos se faz inevitável.

A ideia da autonomia moral é alentadora. Antes se dizia: “quem o alheio veste na praça o despe”. Essa palavra é expressiva, mas parcial, pois não abrange um percurso mínimo de explicação de um fato. Bem compreendida, porém, fará sentido e então não será repelida.

O advento do espiritismo trouxe uma nova visão, revolucionária, para a justiça dita divina, mas, a princípio, talvez pelo afã de tentar aplicar a ideia (mais…)

O gato e o guizo

Ou por um espiritismo respeitado.

 

Fazia mais de três meses que o gato fora tirado de casa e posto na rua. Ou não perceberam, ou não o viram, ou, quem sabe, não quiseram ver. Teriam sido iludidos por uma imagem que o tempo familiarizou, a do bichinho terno e meigo? Sabem todos, as imagens possuem uma capacidade intrínseca de iludir, posto que parecem fáceis de ler. Ninguém viu. Estavam como na canção do Chico, “falando de lado e olhando pro chão”?

Havia no gato de pele macia uma mancha vermelha, chamando a atenção de tal forma que deveria incomodar ao primeiro transeunte que passasse por ele. Impossível não notar. Ainda assim, o gato caminhava no seu passo manso por entre pessoas proseantes, risonhas, jovens e adultos, vestidos com aprumo ou em trajes simples, gente que passeava ou andava a passo largo rumo ao trabalho. Como não o veriam, o animalzinho que tantos encantos arranca, com aquela mancha postiça tão marcante?

O nosso personagem virou esquinas, andou em avenidas, passou por ruas descalças, esteve em frente a prédios suntuosos e casas simples, viu pessoas nas janelas e janelas sem ninguém e apesar do seu miado dolorido, (mais…)

Allan Kardec: texto e contexto

SOBRE AS EDIÇÕES “ANTIRRACISTAS” DE SUAS OBRAS *

Por Jon Aizpúrua

I – O TEMPO DE KARDEC E OS AVANÇOS CIENTÍFICOS E SOCIAIS

Ao longo dos séculos, a humanidade passou por muitas e intensas revoluções do conhecimento que estão oferecendo novas perspectivas para a compreensão e interpretação do que constitui o que é concebido como realidade. É o que se chama, segundo Kuhn, mudança de paradigma, ou seja, a substituição de antigas abordagens por outras mais eficientes para explicar contradições, esclarecer enigmas e apresentar hipóteses que parecem ter maior plausibilidade e que, se verificadas, são incorporadas ao patrimônio científico e cultural. O dinamismo e a interação desses processos são a própria essência do progresso.

A emergência de novos paradigmas ou esquemas interpretativos sobre o universo, a vida, o ser humano, bem como os princípios e valores vigentes no campo cultural de ordem ética, moral ou jurídica, ocorre em determinado contexto social, histórico, econômico, político ou espiritual, de modo que nenhum sistema de pensamento escapa aos condicionamentos inerentes à época em que aparece e se desenvolve, Isso se manifesta na aceitação das crenças dominantes e na linguagem utilizada para expressá-las.

É claro que o espiritismo não é exceção a essa lei geral que sinaliza o processo gradual de avanços no campo do conhecimento. Surgido em meados do século XIX, graças ao trabalho minucioso, teórico e experimental, realizado por Allan Kardec, com a assessoria de espíritos desencarnados de elevada condição intelectual e moral, não poderia deixar de receber as influências do contexto geral de sua época, representado pelas ideias filosóficas, científicas, (mais…)

Quem foi que disse Deus?

E mais: esta extraordinária peça chamada cérebro.

Às vezes me vejo agitado pensando nos amigos adeptos do nada. Nada existe, nada prossegue, nada sobra, ou que seja imortal enquanto dure, para lembrar a chama do poetinha.

Imagem de ressonância magnética do cérebro humano mostrando as curvas das fibras neuronais. PROJETO CONECTOMA HUMANO MGH-UCLA

Agora sou informado, para bem do meu bem-estar mental, da existência de uma nova rede sobre a rede cerebral conhecida desde Penfield. Há uma duplicidade de redes ou uma rede sobre outra, mas sem duplicidade de funções. Cada uma delas com sua complexidade e sua complexa funcionalidade.

Com isso minha tendência é de me acalmar, ou pelo menos saber que posso; o diabo é conseguir. Minha agitação, dizem os homens de ciência, se explica pela descoberta da nova rede cerebral. É que quando penso nesses amigos do nada a mente-cérebro envia um comando e, no meu caso, o corpo reage na altura do coração, o que me revela agitado. Uma outra pessoa poderia reagir na forma de dor de barriga.

Mas ao mesmo tempo que penso em mente e digo mente-cérebro, sou alertado por um outro neurocientista de que a mente não existe, tudo é cérebro. A nova rede cerebral descoberta é para ele a confirmação do que diz. Se a seguir (mais…)

Onde a raça, (ul)trapaça

O chicote e o tronco recolhidos dos morros do sofrimento foram retirados dos museus da história onde se encontravam, para açoitar a palavra daqueles que “deveriam” ter tido o cuidado de escrever e pensar em acordo com o avanço cultural de 100 anos depois.

A louca alegria do suplício prossegue…

Allan Kardec, o vulto humano gerado nas terras gálicas de um tempo distante e dado à luz na Paris do dia 18 de abril de 1857, ele e seus espíritos insolentes, são as vítimas brancas da mentalidade negra dos justiceiros da atualidade. Estes se lançam aos mesmos espaços públicos onde teriam sido um dia personagens e vítimas do açoite empunhado pela mão desumana e agora gritam por justiça, tendo à sua frente, de cabeça baixa e olhos ao chão, aqueles cuja obra rompeu, como poucas, o pensamento retrógrado do bem e do mal. O açoite tine aos ventos enquanto o sangue das palavras espirra para todos os lados. O homem que dá a voz de comando nesta nova colonialidade respira, com parcial alívio, por afrouxar do peito o traumático cravo ali pregado, que há tempos o atormenta. Sorri, feliz. Enfim, a justiça está em andamento. Onde a raça, (ul)trapaça.

Mas o ódio, embalado com o celofane translúcido deste tresloucado afeto, só se dará por extinto quando todos os corpos e todos os espíritos vierem ao chão tingido por todos os sangues. Neste 18 de abril de 2023, a nova vítima foi apresentada no Gólgota (ou Pelourinho?) da virtualidade: O livro dos espíritos, posto disponível para gregos e romanos como o infiel convertido e, enfim, salvo. Eis que agora é antirracista. No novo Index Librorum Prohibitorum foram lançados o pensador e a obra incorrigivelmente racista. A paz transparece estranha e serena num céu de nuvens densamente carregadas. (mais…)

O futuro é amanhã

O EàE é a inteligência artificial do espiritismo e assim como no meio tecnológico todos a temem e ninguém sabe para onde vai, o antirracismo do EàE é a tentativa de controlar a doutrina sem o apoio dos algoritmos.

O dilema que está por trás do argumento apresentado pelo EàE, de que está sendo vítima do discurso de ódio é falso. Ao se colocar como vítima, encontra o discurso ideal para fugir do diálogo e sair como herói, mas herói de papel, cuja única utilidade – se é que isso contém alguma utilidade – é abreviar o tempo de condenação geral do pensamento de Allan Kardec, para tal utilizando-se de um único tiro: Kardec é racista e como tal todo o seu pensamento o é também.

É através desse artifício que a inteligência mesquinha do EàE, o paladino auto erigido do antirracismo que, por falta total de capacidade de agir socialmente de forma plural sem uma bandeira emprestada, aqui no meio espírita se localiza. Por ser mesquinha, egoísta e miseravelmente artificial, é também a reedição de um tal exército de Brancaleone formado pelos pobres esfarrapados factuais perdidos nas estradas vicinais do pensamento espírita.

O EàE decreta para amanhã, dia 18 de abril, quando espíritas de todo o mundo comemoram o lançamento da primeira edição de seu livro básico, aquela com pouco mais de 500 perguntas, no longínquo, mas presente ano de 1857 na cidade luz, Paris. (mais…)

Coletivo vai publicar todos os livros de Kardec com o selo ´edição antirracista´

O livro dos espíritos está prometido para este mês de abril e o molde a ser utilizado é o mesmo de O evangelho segundo o espiritismo.

Assiste-se, com verdadeira vergonha alheia, para utilizar da expressão da moda, ao desfile de pronunciamentos de completo descaso para com o espiritismo e seu fundador, Allan Kardec, sejam feitos em lives, sejam escritos aqui e ali. O mais estarrecedor desses pronunciamentos, por isso mesmo, é o que expressa a arrogância e a prepotência dos responsáveis pela edição interpolada, ao afirmar que todos os livros de Kardec receberão igual tratamento, ou seja, serão publicados com as mesmas tintas vermelhas que aparecem na expressão ANTIRRACISTA de O evangelho segundo o espiritismo. Os autores desse ato estarrecedor estão tão convictos dessa dolorosa missão autoatribuída que afirmam não se intimidar com nenhuma crítica e que nada os vai parar.

Mas é preciso colocar às claras que o projeto de interpolação dos livros de Allan Kardec, cujo primeiro, O evangelho segundo o espiritismo, foi lançado no final de 2022, tendo ganhado ampla divulgação no primeiro trimestre de 2023, tal projeto teve início muito tempo atrás, quando o coletivo EàE iniciou as conversas a este respeito. A ideia era mais agressiva ainda, pois se tinha por certo que seriam feitas adulterações explícitas no texto, modificando as palavras de Kardec consoante os desejos do momento. Era este o objetivo pretendido, que só não se empreendeu por um lampejo isolado de bom-senso, uma vez que de qualquer maneira a obra foi adulterada.

(mais…)