Dia: 25 de janeiro de 2016

RESPOSTA DO ALÉM

Página do livro “Luz no lar”, psicografado por Chico Xavier, de autoria de diversos espíritos. Leia o artigo “A palmatória e a oficina se destinam aos filhos alheios”, para melhor compreensão deste texto.

Minha irmã: valho-me do “correio do outro mundo” para responder à sua carta, cheia da sensibilidade do seu coração de mulher.

Pede-me a senhora o concurso de Espírito desencarnado para a solução de problemas domésticos no setor de educação aos filhinhos que Deus lhe confiou. Conforma-me, sobremaneira, a sua generosidade; entretanto, minha amiga, a opinião dos mortos, esclarecidos na realidade que lhes constitui o novo ambiente, será sempre muito diversa do conceito geral.

A verdade que o túmulo nos fornece renova quase todos os preceitos que nos pautavam as atitudes.

Aí no mundo, entrajados no velho manto das fantasias, raros pais conseguem fugir à cegueira do sangue. De orientadores positivos, que deveríamos ser, passamos à condição de servidores menos dignos dos filhos que a providência nos entrega, por algum tempo, ao carinho e ao cuidado.

Na Europa, trabalhada pelo sofrimento, existem coletividades que já se acautelam contra os perigos da inconsciência na educação infantil entre mimos e caprichos satisfeitos.

Conhecemos, por exemplo, um rifão inglês que recomenda: – “poupa a vara e entrega a criança”. Mas, na América, geralmente, poupamos os defeitos da criança para que o jovem nos deite a vara logo que possa vestir-se sem nós. Naturalmente que os britânicos não são pais desnaturados, nem monstros que atormentem os meninos na calada da noite, mas compreenderam, antes de nós, que o amor, para educar, não prescinde da energia e que a ternura, por mais valiosa, não pode dispensar o esclarecimento.

Dentro do Novo Mundo, e principalmente em nosso País, as crianças são pequeninos e detestáveis senhores do lar que, aos poucos, se transformam em perigosos verdugos.

Enchemo-las de brinquedos inúteis e de carinhos prejudiciais, sem a vigilância necessária, diante do futuro incerto. Lembro-me, admirado, do tempo em que se considerava herói o genitor que roubasse um guizo para satisfazer a impertinência de algum pequerrucho traquina e, muitas vezes, recordo, envergonhado, a veneração sincera com que via certas mães insensatas a se debulharem em pranto pela impossibilidade de adquirir uma grande boneca para a filhinha exigente. A morte, todavia, ensinou-me que tudo isso não passa de loucura do coração.

É necessário despertar a alegria e acender a luz da felicidade em torno das almas que recomeçam a luta humana, em corpos tenros e, muita vez, enfermiços. Fora tirania doméstica subtraí-las ao sol, ao jardim, à Natureza. Seria crime cerrar-lhes o sorriso gracioso, com os ralhos inoportunos, quando os seus olhos ingênuos e confiantes nos pedem compreensão. Entretanto, minha amiga, não cogitamos de proporcionar-lhes a alegria construtiva, nem nos preocupamos com a sua felicidade real. Viciamo-lhas simplesmente.

Começamos a tarefa ingrata, habituando-lhes a boca às piores palavras da gíria e incentivando-lhes as mãos pequenas à agressividade risonha. Horrorizamo-nos quando alguém nos fala em corrigenda e trabalho. A palmatória e a oficina destinam-se aos filhos alheios. Convertemos o lar, santuário edificante que a Majestade Divina nos confia na Terra, em fortaleza odiosa, dentro da qual ensinamos o menosprezo aos vizinhos e a guerra sistemática aos semelhantes. Satisfazendo-lhes os caprichos, dispomo-nos a esmagar afeições sublimes, ferindo nossos melhores amigos e descendo aos fundos abismos do ridículo e da estupidez. Fiéis às suas descabidas exigências, falhamos em setenta por cento de nossas oportunidades de realização espiritual na existência terrestre. Envelhecemo-nos prematuramente, contraímos dolorosas enfermidades da alma e, quase sempre, só reconhecem alguma coisa de nossa renúncia vazia; quando o matrimônio e a família direta os defrontam, no extenso caminho da vida, dilatando-lhes obrigações e trabalhos. Ainda aí, se a piedade não comparece no quadro de suas concepções renovadas, convertem-nos em avós escravos e submissos.

A morte, porém, colhe nossa alma em sua rede infalível para que nos aconselhemos, de novo, com a verdade. Cai-nos a venda dos olhos e observamos que os nossos supostos sacrifícios não representavam senão amargoso engano da personalidade egoística. Nossas longas vigílias e atritos angustiosos eram, apenas, a defesa improfícua de mentiroso sistema de proteção familiar. E humilhados, vencidos tentamos debalde o exercício tardio da correção. Absolutamente desamparados de nossa lealdade e de nossa indesejável ternura, os filhos do nosso amor rolam, vida afora, aprendendo na aspereza do caminho comum. É que, antes de serem os rebentos temporários de nosso sangue, eram companheiros espirituais do campo a vida infinita, e, se voltaram ao internato da reencarnação, é que necessitavam atender ao resgate, junto de nós outros, adquirindo mais luz no entendimento.

Não devíamos cercá-los de mimos inúteis, mas de lições proveitosas, preparando-os, em face das exigências da evolução e do aprimoramento para a vida eterna.

Desse modo, minha amiga, use os seus recursos educativos compatíveis com o temperamento de cada bebê, encaminhando-lhes o passo, desde cedo, na estrada do trabalho e dobem, da verdade e da compreensão, porque as escolas públicas ou particulares instruem a inteligência, mas não se podem responsabilizar pela edificação do sentimento.

Em cada cidade do mundo pode haver um Pestalozzi que coopere na formação do caráter infantil, mas ninguém pode substituir os pais na esfera educativa do coração. Se a senhora, porém, não acreditar em minhas palavras, por serem filhas da realidade indisfarçável e dura, exercite exclusivamente o carinho e espere pela lição do futuro, sem incomodar-se com os meus conselhos, porque eu também, se ainda estivesse envolvido na carne terrestre e se um amigo do “outro mundo” me viesse trazer os avisos que lhe dou, provavelmente não os aceitaria.

Irmão X

A palmatória e a oficina destinam-se aos filhos alheios

Ficaria muito agradecido a cada um de vocês, se puderem analisar o pensamento expresso no texto abaixo, especialmente no tocante ao uso da palmatória mencionado em um ponto. Com os tempos atuais reprimindo qualquer atitude dos pais que passe por um leve castigo físico que seja, será que o Irmão X manteria a integralidade deste artigo ou as coisas também mudam de visão no mundo espiritual, adequando-se à nova realidade do mundo social?

Os questionamentos acima são do nosso amigo Marcus Vinícius Ferraz Pacheco. O texto a que se refere tem por título “Resposta do além” (ver post separado), autoria do Irmão X presente no livro “Luz no lar”, datado de 1968 e psicografado por Chico Xavier, livro que reúne páginas de diversos outros autores.

Como se observa, as dúvidas dizem respeito ao complexo tema da Educação e apontam para dois contextos diferentes: o do momento em que o texto é apresentado pelos autores e o momento atual, quase meio século depois. Não é preciso dizer que há profundas diferenças entre tais contextos e certamente isso motivou as reflexões do amigo Marcus Vinicius.

Considero o texto assinado pelo Irmão X primoroso e atemporal, embora tenha sido motivado por um questionamento particular pontual. O autor aproveita a oportunidade de uma pergunta que lhe foi dirigida por uma mãe para uma abordagem com dois vieses, justamente aqueles muito intensamente abordados na atualidade: as responsabilidades do lar e da escola na educação dos filhos. E trata o assunto com uma virilidade irretorquível.

Exemplar esta frase: “Em cada cidade do mundo pode haver um Pestalozzi que coopere na formação do caráter infantil, mas ninguém pode substituir os pais na esfera educativa do coração”.

Irmão X chama a atenção para o que denomina “velho manto das fantasias” que contamina o olhar e provoca a “cegueira do sangue”, desenvolvendo crenças falsas sobre diferenças sociais que nada mais são do que preconceitos que contaminam a mente dos filhos, traduzindo-se por heranças culturais danosas que estarão presentes no seu agir no mundo.

A postura do autor reúne sinceridade e franqueza ao colocar à sua consulente que muitas mães se deixam levar pela inversão de valores na educação dos filhos, disso só vindo a esclarecer-se após a morte, quando o véu da ilusão se desfaz e o chamado amor maternal se mostra em sua feição cruelmente egoísta.

Já, então, Irmão X é levado a referir-se às consequências dessa educação do sentimento desleixada. É quando aponta para a violência que se instala nos filhos contra os próprios pais, manifesta por desrespeito e outras formas na relação cotidiana. Confunde-se ternura e amor com ausência de energia na ação educativa. Daí no dizer do autor o vício que os pais infundem nos filhos com uma felicidade ilusória.

“Horrorizamo-nos quando alguém nos fala em corrigenda e trabalho”, pontua o autor, para a seguir nos oferecer a frase que dá título a este nosso texto: “A palmatória e a oficina destinam-se aos filhos alheios”.

À evidência, Irmão X não está falando daquele instrumento corretivo muito utilizado nas salas de aula do passado que hoje seria algo estarrecedor, abominável. Não se trata de apologia do emprego então nem sugestão absurda para o presente. A palmatória, aqui, é palavra meramente simbólica, representativa da energia que precisa ser aliada da ternura na verdadeira educação, da mesma forma que a palavra oficina, entre outros, possui o significado do labor, da experiência que dá sustentação ao aprendizado.

Estudos e pesquisas apontam hoje claramente o que corresponde ao lar e à escola na educação. O texto do Irmão X aduz o ingrediente que é ainda ausente aí: a reencarnação, que faz aportar nos novos corpos físicos espíritos multimilenários, com suas experiências passadas, necessidades futuras e potenciais a serem trabalhados a partir da família na qual se instalam.

Quando pais e mães, por incompreensão e egoísmo, não encontram a dose certa de energia e ternura na educação dos filhos e os embalam nas cantigas doces da ilusão da vida, com certeza os encontrarão mais à frente colhendo os resultados nas duras experiências do destino.

A “cegueira do sangue”, que hoje se expressa por múltiplas significações, é filha de uma cultura do equívoco. A sociedade carece de uma nova Educação. E a família de uma cultura da verdade.

Espíritos intencionais, médiuns interpretantes. Onde fica o leitor?

Mensagens mediúnicas desafiam a inteligência humana desde Kardec. Com espaço de análise crítica reduzido na comunidade espírita, o leitor se perturba entre sonhos prometidos e realidades sem garantia.

As livrarias estão abarrotadas de romances mediúnicos. Tem-se a impressão de que nada mais se escreve no orbe espírita, senão romances. Parece que a cada segundo um novo livro com tramas reencarnatórias é gestado aqui e ali, por psicógrafos desconhecidos que logo são tratados como especialistas, e conhecidos, que são colocados um passo à frente e revelados como mestres.

O mercado está dominado. O processo se inverteu. Há trinta anos, pouco mais pouco menos, era tão grande o espaço entre o lançamento de um livro e outro que o tempo permitia análises e contrapontos. Não mais. O tempo encolheu e o espaço público abriu crateras que engoliram a razão. Cimentaram, pavimentaram, pintaram faixas de segurança e placas de sinalização, instituíram pedágios e passaram a filmar o movimento dos livros, de modo a garantir que todos transitem com desenvoltura e não sofram percalços por conta da má vontade dos críticos de plantão.

Antes, havia uma cadeia de ecos que supria as deficiências dos jornais doutrinários impressos. A razão espírita expandia-se em diversas faixas auditivas, de modo que os livros mediúnicos quase chegavam aos seus destinatários ao mesmo tempo que suas respectivas análises, no contraponto necessário ao equilíbrio da razão. Evidentemente, a balança sempre pendeu para o livro mediúnico, pois seu apelo é muito mais forte e atinge com muito mais força o leitor, carregado que está do simbolismo da fonte oculta. Mas a simples presença do olhar crítico fazia com que a razão perturbasse de certa forma a emoção e o equilíbrio mínimo se desse. Não importa para onde pendesse o leitor; tinha ele sempre a oportunidade de decidir com base em duas possibilidades.

O tempo, implacável em sua duração, dobrou-se inúmeras vezes como um origami, reduzindo drasticamente o espaço da crítica e ampliando proporcionalmente o espaço do livro mediúnico, com predomínio do romance. O argumento das necessidades humanas de crescimento moral prepondera e já não precisa mais de defensores públicos, uma vez que domou o tempo e ficou preso numa das dobras do origami. Ele agora se manifesta em desprezo à crítica e reforça a visão de um religiosismo sacro. O espaço para o livro mediúnico está aberto e uma de suas garantias está no lucro, fortemente amparado pela mais valia. As editoras o querem, a mídia o aplaude e, mais forte do que tudo, o público o consome.

Ante a dura e cruel realidade, os próprios autores não mediúnicos também sucumbem, destroçando-se nas paredes da resistência editorial, à busca de também produzir seus romances, para manter-se nas prateleiras e nas listas virtuais. Com a crítica ausente, não se sabe a quantas anda a arte literária nem o conteúdo doutrinário dessas produções volumosas. Isso já não mais interessa. A fama fabricada a tudo recobre e o mundo de regeneração, na ilusão das imagens brilhantes, parece próximo, muito próximo, a surgir das brumas dos sonhos que relembram o passado distante, repetindo a saga de leões e cristãos na arena romana.

O mercado é acrítico. Quando algum desgarrado teima em enfrentar a fera dominadora, logo é enquadrado como fora de contexto, perturbador da ordem, inimigo do bem, pois o manto verde de uma paz de água estagnada está posto ante o olhar das massas feito um pêndulo nas mãos de hábil hipnotizador. Basta uma ordem para que o inimigo silencie.

Nos gabinetes, a burocracia do poder mantém os homens do comando ocupados e envoltos em obrigações. O trono do rei, constantemente ameaçado, não permite afastar um olhar furtivo sequer para observar o exterior, senão aquele permitido pelas ventanas digitais que é recolhido por câmaras adredemente postadas de modo a manter uma vigilância segura. Ao poder se atribui a única possibilidade de cumprir os desígnios sagrados que as hostes superiores outorgaram.

Nas praças, parques e avenidas a massa comunga da frágil liberdade de refrescar-se para contrabalançar as imensas pressões do dia a dia. E a essa massa é oferecida a oportunidade esplendorosa da leitura dos romances mediúnicos, de modo a mantê-la sonhando com aquele futuro de soluções mágicas e esperanças vãs. O importante não é a dura realidade de sua impossibilidade, senão alimentar sonhos, desejos e ilusões como contraponto dos conflitos que dividem e sangram.

Quando se esgotarem as reservas morais das massas e o relógio do tempo marcar a hora nona, elas se levantarão para reclamar seu lugar e seus direitos. Aí, então, os burocratas da fé se verão acuados em seus recintos resplandecentes. Todos os lugares, então, estarão ocupados e não lhes restará senão fugir para os recantos de suas próprias incapacidades e chorarem as lágrimas arrependidas dos desmandos.

Médiuns são intérpretes das ideias, afirma Kardec, mas as águas da chuva torrencial sub-literária inundam a terra da razão, abafando a voz do mestre lionês. Na era pós Chico, triunfa o produto psicográfico sob a ilusão de que os médiuns são passivos e por isso mesmo excepcionais. Como se as ideias corressem sem obstáculos pelas sinapses cerebrais e surgissem cristalinas na ponta do lápis. Ou das teclas do computador.

O rei em seu trono de fantasia só cuida de vigiar aqueles que ameaçam a paz do reino.